Argel vem mal, mas será que é essa a hora de o Inter demiti-lo?

Em 11 meses, Argel não consolidou mecânica ofensiva no Inter
Há 19 dias, o Internacional vencia o Atlético Mineiro por 2 a 0 e se consolidava na liderança do Campeonato Brasileiro com uma campanha impressionante e surpreendente, que beirava os 80% de aproveitamento. A perspectiva era ótima: depois de bater rivais fortes, como Santos, São Paulo e o próprio Galo, o Colorado teria pela frente uma sequência com os fracos Figueirense, Coritiba e Botafogo, a qual serviria, pretensamente, para se firmar ou até mesmo disparar na liderança. Mas tudo deu errado a partir de então.

Daquele 19 de junho no qual levou 3 a 2 para o Figueirense até o último domingo, ao perder o Gre-Nal em casa, o Inter obteve um ponto em cinco jogos. Foram duas semanas desastrosas, nas quais viu seu sólido sistema defensivo vazar quase duas vezes por jogo, em média. Os gols de Vitinho e Eduardo Sasha secaram. E a campanha, de quase 80%, caiu para 51% de aproveitamento, um rendimento mais condizente com o nível do elenco colorado do que o irreal começo de competição.

Esse sobe e desce traz os dois lados do Inter de Argel e o resume bem: trata-se de um time médio, apenas. Alguns bons jogadores, algumas boas promessas, dois ou três nomes um pouco acima da média, alguns reforços ainda por se adaptar e uma série de nomes medianos, os quais são comandados por um técnico motivador, e pouco além disso. O Internacional 2016 só obtém bons resultados quando joga com a corda esticada. Isso é um mérito de Argel: se jogar bom futebol nem sempre é possível, o time ganha jogos pela sua abnegação em campo. Em jogos como a vitória sobre o Sport, lá no começo do Brasileiro, o resultado veio assim.

O problema é que ninguém aguenta a corda esticada por muito tempo. Ela serve pra situações específicas, jogos específicos. Mantê-la por 38 rodadas é impossível. O discurso motivador seduz, enche de brilho os olhos quando os resultados são bons, mas, quando as derrotas começam a surgir, ele se torna cansativo. E aí é que vem o questionamento principal que sempre fiz ao trabalho de Argel: quais as soluções táticas e técnicas o Inter tem para vencer sem precisar estar sempre com a corda esticada?

Vitória sobre o Galo, o auge e o fim da grande fase do Inter
O Internacional é um time bem montado defensivamente - o mau desempenho dos últimos cinco jogos é um exagero, um momento excepcionalmente ruim dentro de uma trajetória de 11 meses bastante sólida neste aspecto. Mas o repertório ofensivo, desde o segundo semestre de 2015, é limitadíssimo. No ano passado, o time dependia dos chutes fortes de Vitinho para marcar gols. Em 2016, acrescentou à lista de virtudes os cruzamentos para a área adversária. A recuperação de Vitinho é um mérito de Argel, a eficiência da bola aérea ofensiva também. Mas isso é muito pouco.

No Gre-Nal deste domingo, vimos como o Inter é um time engessado e pouco criativo. No primeiro tempo, entrou com três volantes, como se com dois a equipe já não fosse pouco imaginativa. Acabou dominado pelo Grêmio e foi para o intervalo perdendo merecidamente. No segundo, com Gustavo Ferrareis comandando a reação, teve várias oportunidades - a grande maioria delas, porém, em... chutes de Vitinho ou cruzamentos. Nenhuma troca de posicionamento, nenhum dinamismo, nada além de forçar o que todos estão carecas de saber. O empate não veio principalmente por conta desta falta de alternativas, e isso que o recuo excessivo do Grêmio foi um verdadeiro convite à criação de chances de gol. As execuções foram ruins, a fase é ruim. E o mais grave: quase todas as oportunidades vieram na primeira metade da etapa final - o período no qual o time jogou com a corda esticada. Sem ela, mais uma vez rendeu de forma insuficiente.

Se o mérito de Argel era tirar mais do que o elenco podia na base da motivação, e agora nem isso tem conseguido, significa que ele deve deixar o cargo, certo? Errado. Argel não chegou no Beira-Rio para ser campeão brasileiro. Chegou, em 2015, para estancar uma crise terrível, e conseguiu. Neste ano, o objetivo real nunca foi o título nacional, mas manter o Internacional em uma campanha confortável, de talvez beliscar o G-4, coisa que, apesar da piora recente considerável, tem ocorrido. O começo de Brasileirão foi irreal, fora do comum. As derrotas recentes, porém, também são um ponto fora da curva. Elas indignam, assustam até, mas, olhando para a campanha, apenas colocaram o Colorado no lugar que lhe é de direito, pelos investimentos que fez. O começo foi irreal, o momento é irreal, mas o somatório de tudo representa bem o nível deste time.

Demitir Argel, além de interromper um trabalho no meio do ano (o que só é aceitável quando a crise é grande demais ou há riscos de tabela mais graves), seria ir contra uma convicção que a diretoria colorada diz ter: a de montar um time barato e humilde, com o "pezinho no chão". Provavelmente, um treinador novo tirará mais bom futebol deste Inter do que Argel (não) vem tirando desde que assumiu o posto, mas os resultados dificilmente serão muito superiores aos do atual treinador, e não apenas porque ele conhece bem o grupo que tem, mas porque o grupo do Inter não tem condições de ir muito além do que vem conseguindo em termos de resultados. E mais: esse bom futebol provavelmente demoraria um pouco a vir, dada a necessidade de adaptação, de construção e assimilação por parte dos atletas do modelo de jogo, entre outras etapas que precisam de tempo para serem vencidas.

Demitir Argel, em suma, seria mais uma vitória da ditadura dos resultados do futebol brasileiro. Dezenove dias atrás, ao bater o Galo com autoridade, o Inter era favorito ao título, uma máquina. Hoje, uma mediocridade completa. Cadê o pezinho no chão na hora das avaliações?

Fotos: Ricardo Duarte/Internacional.

Comentários

Lourenço disse…
Concordo com o texto. Interessante que esta visão de que o plantel do Inter foi montado para ser bom e barato é um senso comum dos observadores, mas nunca foi o discurso oficial do clube (ao contrário do Grêmio 2015, por exemplo). Apenas se aponta que a folha diminuiu de 2014 para cá e se fala em valorizar a categoria de base, seja lá o que isso quer dizer. Mas nunca vi austeridade, corte de custos e humildade financeira no discurso da direção colorada. E isso não é uma crítica nem elogio, é uma constatação que me ocorre.
Chico disse…
Douglas:"Vou sair pra beber de trator hoje". Gênio.
Vicente Fonseca disse…
É verdade, Lourenço. Acho que esse discurso não é feito pela direção porque seria, de certa forma, assumir o erro de terem gastado além do que deveriam em 2015. Se fosse uma troca de gestão tipo Koff-Romildo, por mais que seja de um mesmo grupo político como no caso gremista, acho que o discurso seria mais facilmente utilizado.