A pior das noites de Roger

Giuliano enfrenta Ortigoza: empate na Arena não serviu a ninguém
A ausência de Miller Bolaños e o aspecto físico (cansaço das partidas recentes, todas de alta intensidade, mais o campo molhado), além da inegável qualidade do San Lorenzo, ajudam a explicar a noite problemática do Grêmio hoje. Porém, não dá para desconsiderar que, desta vez, várias escolhas efetuadas pelo técnico Roger Machado nesta quarta-feira colaboraram para que o Tricolor deixasse pelo caminho dois pontos importantíssimos em sua difícil caminhada na fase de grupos da Libertadores.

O jogo em termos gerais foi parelho e empolgante, cumprindo com as melhores expectativas. Ambas as equipes precisavam da vitória, e buscaram o gol a noite toda. Mas, apesar de estabelecer um equilíbrio de ações ofensivas com o adversário, o Grêmio foi, na maior parte do jogo, menos organizado que o San Lorenzo. O primeiro erro de Roger colaborou para isso: a escalação de Everton em detrimento de Henrique Almeida. Não pela atuação ofensiva do jovem ponteiro (ele foi o melhor do setor, quase sempre envolvente), mas por seu baixo interesse nas tarefas defensivas. Tal problema foi notado por Giuliano, Maicon e Edinho ainda no primeiro tempo - todos reclamaram com Roger a respeito da pouca recomposição de Everton, o que sobrecarregava o meio-campo, já que o San Lorenzo, mais compacto, contava sempre com cinco homens neste setor.

Neste caso, Roger fez uma aposta que não se mostrou correta: priorizou a agressividade do garoto pelo lado do campo em detrimento do controle tático do setor de meia-cancha. Não era incorreto supor que Everton levaria vantagem sobre os laterais argentinos (tanto que levou, e olha que Buffarini é muito bom marcador), mas o mais prudente era ter apostado nisso como alternativa para o decorrer do jogo. Ontem, era noite para priorizar uma robustez maior no meio. Isso seria mais viável com Henrique Almeida no centro do ataque e Luan, que participa mais que Everton neste aspecto, aberto pelo lado, mantendo a formatação tática que goleou a LDU.

O gol gremista surgiu, curiosamente, numa boa arrancada do inseguro e exposto Wesley pela direita. Falta batida com perfeição por Fred, jogador que vem cumprindo o que dele se espera, vide o Goiás de 2015: zagueiro instável em sua tarefa básica (marcar, afastar e antecipar), mas exímio em bolas paradas. Everton quase fez o segundo um minuto depois, que poderia matar o jogo. O San Lorenzo, experiente, sentia a pressão de estar perdendo mais uma, começava a ficar nervoso. Mas chegou ao empate noutras duas deficiências gremistas: a afobação de Edinho na marcação, cometendo falta desnecessária ao lado da área, e a insegurança da bola aérea defensiva, local onde Erazo vem fazendo grande falta, apesar do brilhantismo de Geromel.

O jogo voltou a ficar à feição do San Lorenzo, que ocupou o meio com imposição e só não virou ainda no primeiro tempo porque Fred cortou em cima da linha. Mas no segundo tempo o Grêmio voltou mais robusto, intenso, participativo na marcação. O jogo mudava de figura porque agora o time argentino mais contra-atacava que mandava no meio. Até que Roger cometeu o segundo erro da noite: Luan não estava em grande jornada, mas era dos poucos que tinha alguma vitória pessoal na frente. O treinador abriu mão de sua capacidade criativa muito cedo, investindo também cedo demais na bola aérea de Bobô. Poderia ter sacado Douglas, mais apagado, para a entrada de Henrique Almeida, mais dinâmico que Bobô.

Com um time mais lento e menos criativo, o Grêmio voltava a ser pressionado, perdendo novamente o controle das ações. Aí, Roger descambou de vez: retirou Giuliano, outro que não fazia partida ruim, colocando Fernandinho - Everton desta vez é quem poderia ter saído, pois é jogador de característica parecida. Inconsequente como de costume, o novo ponteiro teve uma ou duas boas chegadas à linha de fundo que não tiveram resultado algum. Vendo que o panorama não mudou, o técnico gremista chutou o balde de vez: tirou Douglas, o único meia ainda em campo, e colocou o segundo centroavante, Henrique Almeida. Douglas poderia ter saído bem antes, mas jamais naquela hora. E Henrique deveria ter entrado bem antes, mas jamais naquela hora.

O resultado da última troca desastrada foi óbvio: o Grêmio ficou apartado em dois, cheio de atacantes na frente e defensores sem atrás, sem ninguém para fazer a transição. O San Lorenzo virou dono completo das ações nos 20 minutos finais muito mais por isso que por um suposto cansaço gremista. Mais feliz que Roger ontem, Pablo Guede viu o buraco e colocou Romagnoli no lugar de Cerutti. Um meia criativo num lugar de um atacante. Os argentinos eram muito mais equilibrados e consistentes. O 1 a 1, no fim, acabou quase que saindo no lucro para os gaúchos.

A situação é complicada. Com apenas 4 pontos, o Grêmio vira o turno já com dois jogos feitos em casa, e agora terá duas partidas complicadas fora, onde terá de conquistar no mínimo 2 ou 3 pontos para não chegar morto na última rodada, no único jogo que ainda resta em Porto Alegre. Mas isso não significa que a equipe tenha de jogar fechada em Buenos Aires, terça que vem: o San Lorenzo é um time que gosta de enfrentar rivais resguardados, mas sofre com quem o ataca, pois, com Guede, é muito mais vulnerável atrás que nos tempos de Bauza. Lembrando: os argentinos entrarão em campo em situação ainda mais complicada que o Tricolor semana que vem. Arriscarão tudo em busca da vitória, ou serão virtualmente eliminados. Chamá-los para a pressão é suicídio. O desafio é corrigir todos os problemas vistos hoje a tempo de evitar uma derrota, resultado que obrigaria um triunfo em Quito para tornar a classificação viável. Isso é que preocupa bastante, pois não é pouca coisa a ser corrigida.

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Copa Libertadores da América 2016 - 1ª fase - Grupo 6 - 3ª rodada
9/março/2016
GRÊMIO 1 x SAN LORENZO 1
Local: Arena do Grêmio, Porto Alegre (RS)
Árbitro: Daniel Fedorczuk (URU)
Público: 41.927
Renda: R$ 2.104.161,00
Gols: Fred 25 e Cauteruccio 33 do 1º
Cartão amarelo: Edinho, Marcelo Oliveira, Angeleri, Mussis e Ortigoza
GRÊMIO: Marcelo Grohe (7), Wesley (5), Geromel (8), Fred (6) e Marcelo Oliveira (6,5); Edinho (4,5), Maicon (6), Giuliano (5,5) (Fernandinho, 24 do 2º - 5) e Douglas (4,5) (Henrique Almeida, 31 do 2º - sem nota); Luan (5,5) (Bobô, 14 do 2º - 5) e Everton (6,5). Técnico: Roger Machado
SAN LORENZO: Torrico (4,5), Buffarini (5,5), Angeleri (5), Caruzzo (6) e Más (6,5); Mussis (6), Ortigoza (5,5) (Kalinski, 46 do 2º - sem nota) e Belluschi (7); Cerutti (5,5) (Romagnoli, 38 do 2º - sem nota), Cauteruccio (6) (Matos, 27 do 2º - 5) e Blanco (6). Técnico: Pablo Guede

Foto: Lucas Uebel/Grêmio.

Comentários

Anônimo disse…
Roger mexeu mal, isso é consenso, mas o time sentiu o cansaço sim. E nem teria como ser diferente, foi o 7º ou 8º jogo seguido com titulares (exceto contra o São Paulo-RG). Infelizmente, esse grenal entre os dois jogos foi uma arapuca montada há meses, e faltou a quem comanda lidar com isso mais racionalmente.

Mas ainda há chances, se o time levar 2 ou 3 pontos nos 2 próximos jogos, fora que vai haver um mês até enfrentar a LDU. Se chegar vivo até o jogo com o Toluca, é missão quase cumprida.

Tiago
Vicente Fonseca disse…
Concordo plenamente contigo, Tiago. Mas fiz questão de destacar as más substituições do Roger justamente porque o elogio bastante. Além disso, a desorganização contribui para o cansaço. Se o Grêmio corresse certo, e não o tempo atrás do San Lorenzo, provavelmente não teria se desgastado tanto. As trocas só desorganizaram mais ainda o time.

Esqueci de mencionar no texto essa questão do jogo da LDU ser daqui a um mês. Com certeza, muita coisa poderá ser corrigida até lá. O Inter do Aguirre foi assim em 2015: bagunçado antes da parada de um mês em março, mas voltou patrolando La U em abril. A pausa pode melhorar bastante coisa, sim. A questão é conseguir esses 2 ou 3 pontos fora jogando o que jogou ontem. Dá sim, mas não é fácil.
Anônimo disse…
Endosso a opinião do Tiago: jogar um Gre-Nal com titulares à vera, às vésperas de um jogo importante de Libertadores, só se explica pela demência política do clube.

Sancho disse…
Vou discordar de vocês. O Grêmio tinha que ter ido à vera nesses três jogos, como foi. Eram três jogos em que a vitória era absolutamente necessária. Se era para poupar alguém, que se poupasse ANTES dessa sequência. Não deu, mas isso não quer dizer que a postura estivesse errada.
Sancho disse…
O Grêmio precisa de títulos, qualquer título. Estadual, Liga, Libertadores, tudo vale.
Anônimo disse…
Nenhum time grande gasta mais de 5 milhões/mês com folha pra ganhar estadual. A perda do Miller é a prova mais eloquente disso. E nenhum técnico ganha respaldo por levar o gauchão, tanto que faz 6 ou 7 anos que o treinador campeão cai em julho ou agosto.

Roger errou nas alterações ontem, como o comando errou em escalar o time principal nessa sequência. Não fosse o fato de ser grenal, teriam posto um time misto ou reserva domingo. Mas não está tudo perdido, é mais questão de ajustar algumas coisas num trabalho que é bom até o momento.

Tiago
Marcelo disse…
Não dá pra ganhar 2 ou 3 pontos, nos jogos fora, tem ser 2 ou 4. O grupo está tao equilibrado que não dá para perder. Me preocupa que antes do jogo, a direção estava falando em jogar na Argentina por um empate. Esse raciocínio é muito perigoso.
Vicente Fonseca disse…
Eu sou favorável a titulares no Gre-Nal por um único motivo: valia pela Primeira Liga. Esta competição ser valorizada considero importante. Estadual, não. Não neste formato absurdo e inchado - colocar titulares num campeonato como esse só ajuda a legitimá-lo, quando o correto é esvaziá-lo para que melhore, na minha opinião. Mas entendo tua posição, Sancho (tu bate nessa tecla há bastante tempo).

E Marcelo, sim, pode fazer bastante sentido essa conta. Fazer 2 pontos pode, sim, ser melhor que fazer 3 num grupo equilibrado. Por mais paradoxal que possa parecer. Lembro que naquele grupo de 2013 (contra Fluminense, Huachipato e Caracas), o Grêmio fez dois pontos nos últimos dois jogos e se classificou, mas se fizesse três teria ficado de fora.
Para o Estadual, o Grê-Nal era irrelevante. Passam oito, quarto lugar garante as quarta em casa, e estamos bem encaminhados. Para a Liga, no entanto, vencer garantiria classificação. Por isso, a vitória era crucial.

Na primeira Copa Sul, nós podíamos perder o Grê-Nal por dois a zero. Perdemos por 2-0. Saí do Beira-Rio feliz da vida, e fomos campeões logo depois.

Para encerrar, a maior prova de "vacas magras" é perder sistematicamente o Estadual. Sempre foi, e não mudou. Não precisa jogar a morrer todos os jogos, mas tem que se preparar para vencer o campeonato. Só isso...
Vicente Fonseca disse…
Isso é verdade.

Aliás, essa de passarem 8 de 14...
Não podia ser diferente. Agrada a todo mundo. Para nós, é uma baita ajuda, inclusive. O campeonato, de verdade, é nas finais. Agora, é treino de luxo. Fosse por pontos corridos, seria uma pressão do c*c*t* por resultados desde a primeira rodada.

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P.S.: E no basquete universitário americano que classifica TODO MUNDO?! Sério! E eles assistem a primeira fase vidrados, como se fosse decidir a vida...
Vicente Fonseca disse…
O Campeonato Roraimense de 2009 tinha essa fórmula. A classificação da primeira fase só servia pra definir quem pegava quem no mata-mata. Hahah

Sobre o Gauchão, acho melhor uma fórmula de pontos corridos em turno único que esta atual. Menos datas e mais competitividade.