Atribuir o resultado ao cansaço do Grêmio é uma injustiça com o Criciúma

Só dois times ganharam duas vezes do Grêmio na Arena até hoje: Coritiba e Criciúma. Ontem, o roteiro da vitória do Tigre foi de certa forma semelhante ao de seu primeiro triunfo no novo estádio gremista, ocorrido em 2013: a equipe de Dejan Petkovic suportou as várias chegadas de perigo do time da casa e foi letal nas oportunidades criadas. Ainda assim, o resultado foi bem menos circunstancial que o de dois anos atrás, quando o goleiro Galatto foi o personagem da vitória catarinense: o time visitante teve chances claras até de ampliar no segundo tempo e viu seu goleiro Luiz incrivelmente ser pouco exigido, apesar do grande volume de jogo gaúcho.

A colocação mediana na Série B esconde um crescimento recente do Criciúma com Pet na casamata. Invicto com o sérvio, o time catarinense fez um primeiro tempo cheio de personalidade. A equipe era humilde na marcação ao mesmo tempo que tinha uma postura corajosa: fechava-se em duas linhas de quatro sem a bola, com o recuo dos pontos Juba e Lucca à mesma linha dos volantes Wellington e Marcão, o que dificultava ao Grêmio a penetração. Isso enervava os donos da casa, que sentiam a dificuldade do jogo e ficavam cada vez mais ansiosos. Ao longo do jogo, o Tricolor errou nada menos que 53 passes, número muito elevado.

Dada a rapidez dos dois ponteiros e à compactação da equipe, cada erro gremista propiciava um contragolpe perigoso ao time visitante. Ainda assim, mesmo jogando no erro do time da casa (o gol surgiu assim, num passe errado de Geromel), o Tigre não era uma retranca: teve 53% da posse de bola na etapa inicial, sinal claro do equilíbrio do jogo. O recuo, mesmo, houve após o 1 a 0. Algo absolutamente normal, até pela diferença técnica entre os times e pelo fato de o jogo ser em Porto Alegre. Ainda assim, Pet não substitui nenhum dos três atacantes, para sempre ter a opção de agredir se fosse necessário. Apenas exigiu deles dedicação total na recomposição.

No segundo tempo, esse cenário se acentuou. Mas não era uma estratégia defensiva desorganizada, um bumba-meu-boi. Ao contrário: com uma dedicação comovente na marcação, a equipe catarinense se defendia numa linha de seis homens que complicava demais a tarefa gremista de criar, e, ainda que com raridade, dispunha dos contragolpes. Com 63% do tempo com a bola nos pés, o Grêmio não teve impaciência para trocar passes, girar o jogo e tentar abrir algum espaço. Conseguia, por vezes, o que prova a boa qualidade de sua equipe. Mas aí faltou grupo, algo que sabemos que é deficiência: após a saída do extenuado Luan, o Tricolor só chegou uma vez, num chute torto de Galhardo, aos 44. Fernandinho deu mais intensidade ao time que Douglas, mas lhe falta ritmo. O mesmo deve justificar a não entrada do uruguaio Maxi Rodríguez, curiosamente o autor do gol gremista na derrota de 2013.
Na linha de seis defensores do Criciúma, o ponteiro Juba recua na mesma linha dos zagueiros. Neste quadro, a compactação do time de Pet é evidente: há oito jogadores do Tigre separados por menos de 10 metros, e os dez de linha ocupam um espaço de no máximo 25 metros. O Grêmio ainda assim acha espaço: Marcelo Hermes (pedindo a bola pela esquerda) bateu na rede pelo lado de fora
O principal ponto positivo para o Grêmio, além das muitas oportunidades criadas, é que Roger é um técnico extremamente ponderado e com boa leitura do jogo. Não falou de arbitragem, embora o gol de Pedro Rocha tem sido mal anulado e pudesse ter mudado a história do jogo; não demonstrou irritação por uma suposta atuação fraca do seu time, pois ela não houve; não usou a desculpa do cansaço (embora ele tenha sido nítido, até porque os próprios erros de conclusão indicam desgaste físico), pois isso seria retirar os méritos do Criciúma. E enxergou o que de fato ocorreu: o Grêmio errou demais na hora de finalizar. Quando venceu o Cruzeiro por 1 a 0, há duas semanas, o técnico tricolor disse que as chances não convertidas não o preocupavam, pois Fábio havia sido o personagem do jogo. Ontem, ao contrário, Luiz fez poucas intervenções decisivas. Faltou qualidade nesse aspecto ao time gaúcho.

A curiosidade é saber como o Criciúma se portará no Heriberto Hülse. Mesmo apaixonada pelo time, a torcida do Tigre deve compreender que se a equipe tentar se impor correrá grande risco de ser derrotada. Ao mesmo tempo, jogar para apenas anular o time gaúcho pode cobrar um alto preço: o do cansaço. O Grêmio pode estar enfrentando uma sequência forte de jogos, mas os catarinenses também. Exercer a mesma marcação cerrada da Arena em menos de uma semana poderá extenuar o Criciúma. E vale lembrar: mesmo com todos os méritos de uma marcação bem feita, o time visitante viu os gaúchos criarem nada menos que 14 situações de gol ao longo da noite, um número muito alto. Por tudo isso, o confronto segue completamente indefinido. Desde que o Grêmio capriche mais nas finalizações, claro.

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