Ao forçar o revezamento, Aguirre começa a confundir convicção com teimosia



Diego Aguirre está começando a perder a mão no seu trabalho à frente do Internacional. Não que seja algo irreversível ou que invalide o grande primeiro semestre que fez. Ao contrário: a sistemática de rodízio de peças que havia até a parada na Libertadores era acertada, e isso ficou provado pelos ótimos resultados obtidos pela equipe. O problema é que a situação atual exige decisões diferentes das de 40 dias atrás, por diversas circunstâncias. O que tem lhe faltado é leitura do que está ocorrendo no presente: a convicção naquele modelo de trabalho não pode se transformar em teimosia, quando o momento pede uma mudança de planos.

A primeira diferença de maio pra cá diz respeito ao elenco. Ao contrário do que tinha em mãos dois meses atrás, Aguirre não conta mais com um grupo de jogadores tão farto. Em junho, não puderam atuar vários titulares em vários jogos, seja por lesões ou convocações. Neste caso, é difícil revezar peças sem enfraquecer demais a equipe - isso sem levar em conta que a exigência do Campeonato Brasileiro é muito mais alta que a do Gauchão.

O jogo de ontem, contra o Sport, foi o mais preocupante de todos neste aspecto - não apenas pela constrangedora forma como a derrota por 3 a 0 em si ocorreu, mas pelo que as decisões tomadas indicaram em termos de pensamento. Se já não podia contar com Alisson, Paulão, Juan, Réver e Aránguiz (entre outros) por motivos alheios à sua vontade, o treinador uruguaio simplesmente não podia se dar ao luxo de poupar mais cinco titulares para o jogo em Recife.

Se houvesse uma leitura coerente da situação, no máximo dos máximos dois ou três atletas poderiam ser tirados do time titular, mas ficando como opções no banco de reservas. Nomes como D'Alessandro e Lisandro López, por exemplo, deveriam no mínimo ter viajado, mas jamais ficarem descansando em Porto Alegre, principalmente porque pouco atuaram no último mês. Rodrigo Dourado, por sua vez, viveu situação ainda mais inaceitável: cruzou o país para entrar faltando cinco minutos para o fim da partida. Se é para jogar só esse tempinho, melhor então é ficar em casa. Na Libertadores, lembremos, Valdívia e D'Alessandro atuaram em 30 minutos da partida contra o Atlético Mineiro no Independência. Isso sim é dosar forças sem diminuir a qualidade de uma equipe.

A linha entre convicção e teimosia é tênue, mas para quem enxerga de fora a situação ela fica mais nítida: a convicção se transforma em problema quando a situação prática vira refém do que é planejado. Foi exatamente isso o que aconteceu na Ilha do Retiro. Planejamentos devem ser maleáveis o suficiente para que não se permita que, tendo três dos cinco zagueiros no elenco contundidos, o técnico possa abrir mão do rodízio por um tempo e repetir a escalação da dupla de zaga de um jogo para outro. Mas não: ao deixar Ernando em Porto Alegre, Aguirre se viu obrigado a improvisar Nílton ao lado de Alan Costa. Uma alteração que jamais foi treinada, e que prejudicou o Inter em um dos jogos mais difíceis que a tabela do Brasileirão oferece atualmente.

Além da abundância maior de peças e da exigência maior em termos técnicos, o rodízio não está obtendo resultados bons agora por mais um motivo: a troca de esquema. No primeiro semestre, Aguirre implantou o 4-2-3-1 de forma sólida, o que facilitava a entrada e saída de atletas do time. Todos sabiam exatamente que tarefas cumprir em campo, pois o padrão tático existia, era claro, fácil de cumprir à risca mesmo com uma ou outra improvisação. Diante do Santa Fe, no entanto, o treinador colorado resolveu colocar o time num 4-4-2, para aproveitar o poder de fogo de Nilmar e Lisandro López juntos. Nenhum problema em fazer a mudança numa situação específica, mas perpetuá-la foi um equívoco. Afinal, com a mudança de esquema tático, o que estava muito bem encaixado desencaixou. O rendimento do Colorado nesta nova formação nunca foi tão bom quanto no sistema anterior.

É injusto pegar estatísticas do tipo "o Inter vai jogar contra o Tigres com uma escalação que não atuou junta nenhuma vez na parada da Copa América". Afinal, houve muitas lesões no período, que impediram repetição de equipe. Mas isso não seria nenhum problema se Aguirre mantivesse a metodologia de trabalho implantada nos primeiros meses do ano: a manutenção de um esquema único, usado por titulares e reservas, no qual todos sabiam exatamente que funções executar em campo, e a preservação pontual de titulares, avaliando a situação física e a exigência técnica jogo após jogo. O que o Inter fez nos últimos 35 dias foi justamente o contrário: mudou para um esquema cujo rendimento da equipe é visivelmente mais modesto e preservou jogadores além da medida, descaracterizando o time, perdendo padrão de jogo e confiança para a Libertadores, e jogando pela janela pontos preciosos desperdiçados no Brasileiro. Está na hora de rever os planos. Já passou da hora, até.

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