Quatro injustos pecados

Falar em pecado quando o assunto é o time do Papa (aliás, uma lembrança interminável e chata) é batido demais. Mas foi exatamente isso. Ortigoza e Torrico cometeram o mais grave dos pecados quando se enfrenta um timaço europeu numa decisão de Mundial: errar. E erraram duas vezes. Para derrotar o Real Madrid, o San Lorenzo precisava de erro zero em Marrakech. Só assim poderia igualar ou superar uma seleção mundial, que é o caso da equipe espanhola. Por isso, não deu.

O time madrilenho teve bem mais dificuldades ontem do que diante do Cruz Azul, o que era esperado. Chances de gol no primeiro tempo? Muito poucas. Logo no primeiro minuto, os argentinos tiveram o aviso: erros dificilmente seriam perdoados. O ótimo Mercier perdeu no meio para Kroos, que ligou a Cristiano Ronaldo, mas Benzema bateu mal. De resto, o San Lorenzo passou a cumprir muito bem seu papel: marcou forte, catimbou, picotou o jogo e, na pouca posse que teve no campo ofensivo, valorizou-a ao máximo. Talvez por isso Romagnoli pudesse ter sido escalado, e também para dar um lançamento perfeito, tirar um coelho da cartola. A primeira missão até conseguiu ser levada à risca, mas a segunda jamais pôde ser cumprida sem o camisa 10: o Real Madrid marcou forte também, sob pressão. Não é o tipo de timaço em extinção que joga e deixa jogar.

Mas os principais jogadores do Real Madrid também não jogavam. Carvajal era bastante acionado na direita, Isco tinha certo espaço para trabalhar, mas Marcelo, Cristiano Ronaldo, Bale e James Rodríguez eram muito bem marcados e praticamente não pegavam na bola. O jeito de Bauza para anular estas peças era secar a fonte madrilenha, forçando a marcação em cima das enfiadas de Kroos. Os espanhóis tinham muita posse ofensiva, mas ela era insuficiente para criar chances. A primeira só veio aos 36, num duplo erro: Ortigoza errou passe, e o time europeu ligou o contra-ataque. Escanteio, Torrico não saiu quando deveria e Sérgio Ramos fez 1 a 0. Só na bola parada é que daria mesmo para o time do rei marcar. Ramos já havia aberto o placar contra Bayern, Atlético de Madrid e Cruz Azul, e voltava a fazer o mesmo. É o grande herói deste tetracampeonato mundial.

O San Lorenzo, não poderia ser diferente, voltou mais agressivo para o segundo tempo. Bauza liberou Más e Buffarini para atacarem mais, soltou Kalinski, correu o risco de tomar o contragolpe fatal de Bale ou Ronaldo. Mas foi em novo duplo erro que saiu o gol definitivo, novamente originado de uma bola perdida no meio por Ortigoza, e finalizado num frango de Torrico em chute rasteiro e mascado de Bale. O 2 a 0 era praticamente impossível de buscar. O jogo ficou mais aberto nos minutos finais, Romagnoli melhorou a criatividade argentina, mas ninguém chegou ao terceiro ou primeiro gols.

É uma pena que tenha sido a partir de erros de Torrico e Ortigoza que o San Lorenzo tenha tomado seus gols. Já houve injustiças assim em Mundiais anteriores: em 1995, Dinho e Arce, dois dos maiores personagens da conquista do Grêmio, erraram pênaltis que nunca mais perderiam na final contra o Ajax. Quatro anos depois, foi Marcos, o herói do título sul-americano do Palmeiras, que errou no gol do Manchester United em Tóquio. Agora, o melhor goleiro da Libertadores e o autor do gol do título continental foram os responsáveis pelas jogadas fatais. Ainda assim, não são os culpados. O canto da torcida argentina ao fim deixa claro que o orgulho é maior que a decepção. Ter um orçamento 54 vezes menor que o outro finalista é bem mais explicativo - e bem mais antijogo que qualquer catimba ou falta de fair play.

Em tempo:
- A chance de o San Lorenzo ser goleado ontem era praticamente a mesma que qualquer outro time do Campeonato Espanhol, à exceção do Barcelona e talvez do Atlético de Madrid. O time argentino não é inferior à imensa maioria dos times da liga castelhana. O nível técnico geral dos campeonatos sul-americanos e europeus é semelhante, com raras exceções. Os gigantes do Velho Continente é que destoam.

- Real Madrid chega a 22 vitórias consecutivas. Se ganhar de Valencia, Atlético e Espanyol, bate o recorde mundial do Coritiba de Marcelo Oliveira, obtido em 2012.

- Incrível conquista do Auckland City. O empate em 1 a 1 e vitória nos pênaltis sobre o Cruz Azul representam a maior conquista da história do futebol da Nova Zelândia. Lembrando: nenhum time da Austrália, onde o futebol é totalmente profissionalizado, chegou tão longe em Mundiais.

Mundial Interclubes 2014 - Final
20/dezembro/2014
REAL MADRID 2 x SAN LORENZO 0
Local: Stade de Marrakech, Marrakech (MAR)
Árbitro: Walter López (GUA)
Público: 38.345
Gols: Ramos 36 do 1º; Bale 5 do 2º
Cartão amarelo: Ramos, Carvajal, Kannemann, Barrientos, Ortigoza e Buffarini
REAL MADRID: Casillas (6), Carvajal (6) (Arbeloa, 27 do 2º - 5,5), Pepe (6), Ramos (7) (Varane, 43 do 2º - sem nota) e Marcelo (5) (Coentrão, 43 do 1º - 6); Kroos (6), Isco (6,5) e James Rodríguez (5,5); Bale (6,5), Benzema (5,5) e Cristiano Ronaldo (6). Técnico: Carlo Ancelotti
SAN LORENZO: Torrico (3,5), Buffarini (5,5), Kannemann (5,5), Yepes (5,5) (Cetto, 15 do 2º - 5,5) e Más (6); Ortigoza (4), Mercier (6), Kalinski (5,5), Verón (5) (Romagnoli, 11 do 2º - 6) e Barrientos (5); Cauteruccio (4,5) (Matos, 22 do 2º - 5). Técnico: Edgardo Bauza

Comentários

Chico disse…
O San Lorenzo não teve chance.

E tu tens toda razão, fora os gigantes europeus o resto é tudo parelho.
Vine disse…
Uma pena terem perdido por erros de seus próprios jogadores. Seria mais bonito se o Real tivesse ganho com alguma jogada espetacular do Ronaldo ou do Bale.

Mas a grande vitória do futebol nesse mundial foi o Auckland. Meu irmão tá morando na Nova Zelândia, e falei pra ele que isso era um sinal, já que tinha algum talento como atacante.
Vicente Fonseca disse…
Hahaha, sensacional, Vine! Se ele jogar me avisa que vou dar a nota pra ele no jogo com carinho. hahah