Eles sempre acreditam

Não apenas o Atlético-MG viveu um dos capítulos mais gloriosos de sua história na noite desta quarta. A Copa do Brasil também viveu uma de suas histórias mais ricas no Mineirão. Porque o Corinthians, este time que há quatro ou cinco temporadas é marcado por ser uma equipe que toma poucos gols, entrou com uma enorme vantagem de 2 a 0, e ampliou logo no começo do jogo. Mas o Galo, marcado por nunca desistir, mostrou que a mística da Libertadores do ano passado, a mística de quem acredita sempre, está mais viva do que nunca. Jogou uma partida memorável e chegou aos inacreditáveis 4 a 1 que o levam à semifinal da Copa do Brasil.

Antes mesmo de a bola rolar, já sabíamos que a noite seria de superação. Diego Tardelli jogou na terça pela manhã, horário brasileiro, no outro lado do mundo, pela seleção brasileira, chegou de Singapura à tarde e entrou em campo. Mas foi o outro protagonista, Paolo Guerrero, quem abriu o placar logo de cara, aos quatro minutos, levando vantagem sobre Jemerson, como levou a noite inteira. O 1 a 0 obrigava o Galo a fazer quatro. Tinha o jogo inteiro para isso, mas enfrentava um time defensivamente sólido, e que agora adquiria uma vantagem psicológica imensa. Muita gente neutra desligou a TV. Menos os atleticanos.

Menos mal que Levir nem precisava mexer na formatação de sua equipe, afinal, o Galo entrou de forma ultraofensiva: Leandro Donizete limpando os trilhos com eficiência, Dátolo e Guilherme como volantes-meias pelos lados e três atacantes - Tardelli, Carlos e Luan. E mesmo com a necessidade absurda de fazer quatro gols no Corinthians, o Atlético resolveu jogar e colocar em prática seu esquema insinuante, com uma dinâmica impressionante. Sem posições fixas, os três atacantes confundiam a defesa corintiana o tempo todo. Atrás, Guilherme e Dátolo se movimentavam fazendo o vaivém, buscando a bola como meias e apoiando o ataque com qualidade. No caso de Guilherme, o melhor da noite, ainda aparecendo na área para concluir.

O Galo já era melhor e merecia o gol quando Luan empatou, aos 23, em cruzamento de Guilherme, jogando justamente nesta área de armação de jogadas. Aos 31, foi o próprio Guilherme que marcou o seu, com a bola desviando em Felipe. A esta altura, o Mineirão todo já tremia aos gritos de "eu acredito", e era bom mesmo acreditar. O Atlético dominava por completo a partida e o Corinthians não conseguia jogar. Renato Augusto era submisso, Guilherme Andrade e Petros não o auxiliavam, e Malcom sentia o peso do jogo. Guerrero, por sua vez, criava, sozinho, transtornos à defesa mineira sempre que pegava na bola.

Seja pela saída de Luan, seja pelo acerto na marcação corintiana, o fato é que o Atlético não voltou o mesmo do intervalo. Claro, se Maicosuel fizesse o gol que perdeu logo no primeiro minuto, após passe perfeito de Tardelli, a história poderia ter mudado. Mas o Corinthians passou a ter mais posse no meio, Renato Augusto começou a participar mais da partida e Guerrero seguia muito bem. O Timão segurou a pressão do Galo muito bem (Carlos teve uma chance chutando na trave aos 15, e foi só) e criou chances até de fazer o segundo gol, que definiria o jogo. Já sem Tardelli, naturalmente esgotado, Leandro Donizete e Luan, que vinham bem, marcar dois gols parecia improvável. Foi quando Guilherme tirou mais um coelho da cartola aos 29, marcando o terceiro, em passe de Carlos. E aí, seriam 15 minutos de loucura.

Só aí, a um gol da eliminação, Mano tomou a óbvia providência de colocar Elias e Danilo, para dar mais segurança, experiência e posse de bola ao seu time. Era tarde demais: o Atlético, insistente, chegaria ao quarto gol na hora certa, aos 42, quando já não dava mais tempo para reação. A crueldade no lance foi que a cabeçada de Edcarlos desviou justamente em Guerrero, o melhor corintiano em campo. O Corinthians teve azar: tomou dois gols em bolas que desviaram e enganaram Cássio. Mas quem dá sopa pro azar, ganha azar. E quem insiste e é competente chama a sorte. Merece a sorte.

O Atlético-MG não apenas elimina o Corinthians quando parecia impossível: ele chega às semifinais com total merecimento e ganha o status de favorito ao título pelo modo como se classificou. Quem passa deste modo, ganha força. O Galo deu pinta de campeão. Fará um clássico contra o Flamengo, mas é mais time e parece mais preparado para chegar à decisão. Quanto ao Corinthians, Mano pode estar vivendo seus últimos momentos como técnico do clube. Se a paciência já andava curta com ele, esta eliminação pode ter sido definitiva.

Em tempo:
- Indignado com as falhas dos companheiros, Cássio desistiu do jogo e não voltou para o gol após tentar cabeçada na área. O resultado foi o lance mais espetacular da noite, com Marcos Rocha chutando do meio de campo e Fagner tirando de cabeça em cima da linha. Um resumo da noite épica que viveu o Mineirão.

- O Galo chega às semifinais pela terceira vez. Em 2000, caiu para o São Paulo; em 2002, para o Brasiliense. Agora, tem sua terceira chance de chegar à final pela primeira vez.

Ficha técnica
Copa do Brasil 2014 - Quartas de final - Jogo de volta
15/outubro/2014
ATLÉTICO-MG 4 x CORINTHIANS 1
Local: Mineirão, Belo Horizonte (MG)
Árbitro: Leandro Vuaden (RS)
Público: 32.640
Renda: R$ 1.704.425,00
Gols: Guerrero 4, Luan 23 e Guilherme 31 do 1º; Guilherme 29 e Edcarlos 42 do 2º
Cartão amarelo: Jemerson e Guilherme Andrade
ATLÉTICO-MG: Victor (6,5), Marcos Rocha (7,5), Edcarlos (6), Jemerson (4,5) e Douglas Santos (5,5); Leandro Donizete (7) (Josué, 9 do 2º - 5,5), Guilherme (8,5) e Dátolo (6); Luan (6,5) (Maicosuel, intervalo - 5,5), Diego Tardelli (7) e Carlos (6,5). Técnico: Levir Culpi
CORINTHIANS: Cássio (6,5), Fagner (5), Felipe (4,5), Anderson Martins (5) e Fábio Santos (5); Bruno Henrique (4,5), Guilherme Andrade (4,5) (Elias, 35 do 2º - sem nota), Petros (4,5) e Renato Augusto (5) (Danilo, 37 do 2º - sem nota); Malcom (5) (Luciano, 16 do 2º - 5,5) e Guerrero (7,5). Técnico: Mano Menezes

Comentários

Lourenço disse…
Levir Culpi faz atualmente o melhor trabalho de um técnico no país. As entrevistas dele são todas acima da média e fora do lugar-comum. Trabalha com método e números. Para mim, inesperadamente, é um técnico no auge.
Paul disse…
Que jogo senhores!

E o relato faz jus.

E concordo com o Lourenço, grande entrevista do Levir.

Por falar nisso, comentaram comigo que a "letrinha" que o Felipão largou na entrevista coletiva pro pessoal que " fala demais e depois acontece com eles" era pro Mano. Os doutos concordam?