Uma campeã do tamanho da Copa

"Fizemos tudo o que era possível", disse o gigantesco Javier Mascherano após o jogo, contendo o choro diante das câmeras. É verdade: a Argentina foi ao limite de suas forças, e fez um jogo taticamente quase perfeito. Alejandro Sabella teve o grande mérito de reconhecer que a Alemanha era uma seleção tecnicamente superior, e montou sua equipe para anulá-la. Foi extremamente eficiente até os 7 minutos do segundo tempo da prorrogação, quando Schürrle e Götze, dois dos principais nomes formados por este novo momento do futebol alemão, construíram a jogada do gol que deu o tetra à seleção germânica. 

A proposta de Sabella saiu-se vitoriosa na maior parte do jogo. A lesão de Khedira minutos antes da grande final não esperada por Joachim Löw, que ainda assim tomou a sábia decisão de colocar Kramer por ali, e não Lahm. Com seu lateral direito como volante, fatalmente o esquema com quatro zagueiros atrás voltaria a ser utilizado, o que poderia ser comprometedor diante de uma equipe com Lionel Messi na linha ofensiva. Todos esses pequenos movimentos podem parecer detalhes, mas são decisivos. Afinal, o Maracanã viu uma verdadeira batalha tática, com duas propostas de jogo tentando sobressair-se em relação à outra. 

Sabella acertou em cheio ao apostar num meio com três volantes. Congestionando o setor, impediu que Kroos se adonasse das ações - e ele é capaz de fazer isso contra times organizados, como fez diante da França, antes que se pense que foi só contra o Brasil. Kramer é mais postado que Khedira, tira um tanto do dinamismo que facilitaria "abrir" a defesa argentina. O resultado foi uma série de bolas perdidas na intermediária, que resultaram em alguns contragolpes - muitos os próprios Kramer e Schweinsteiger cortavam. Quando a bola passava deles, Messi tinha a oportunidade de tentar partir para cima em velocidade. Ganhou duas vezes de Hummels assim, nas demais perdeu. Foi o que bastou para duas chances serem criadas. Em outra, neste mesmo espaço que a Argélia causou tanto perigo nas oitavas, Lavezzi cruzou e Higuaín fez, mas completamente impedido.

Kramer lesionou-se, e Löw aproveitou para mudar os rumos de uma partida que não estava como seu time gostaria. Colocou Schürrle e tornou a Alemanha ainda mais ofensiva. Özil passou a jogar na sua, como meia, e cresceu em campo. Os germânicos terminaram o primeiro tempo melhor, algo notado por Sabella, que então resolveu fazer o mesmo que seu colega alemão: desfez a segunda linha de quatro no meio e colocou Agüero, para dar companhia a Messi. A Argentina começou melhor, a Alemanha reagiu. Mais uma etapa de poucas oportunidades e muita disputa. Aos poucos, porém, ficava claro que os argentinos começariam a sentir o lado físico. Ter um dia a menos de descanso e uma semifinal muito mais desgastante pesaram na conta. Isso não explica simplesmente a derrota na prorrogação, mas é um fator que também precisa ser considerado.

O cansaço argentino não era só o de quem havia tido mais dureza na semifinal, mas também o de quem correu atrás da bola na maior parte do jogo. Uma das vantagens do estilo de posse de bola alemão é justamente a de correr menos atrás dela para a recuperação. O fato é que a Argentina, que já estava contente com o empate desde o tempo normal (cada tiro de meta batido por Romero era uma novela), passou a tentar menos o ataque, apostando mais do que nunca na decisão por pênaltis. Não que a equipe tenha abdicado do jogo em si, mas passou a incomodar menos a Alemanha. Boateng, um monstro durante os 90, teve bem menos trabalho no tempo extra, um bom exemplo disso. Ainda assim, Palacio teve a bola do jogo, cara a cara com Neuer. Higuaín tivera a sua no primeiro tempo. Nenhum dos dois matou. Em final de Copa, é imperdoável.

A Alemanha seguiu na sua. Com sua tradicional frieza, manteve o controle dos nervos sempre, seguiu tendo paciência, não se desesperou com o fato de o gol não sair nunca e foi premiada por isso. O curioso é que para um time de excelência coletiva, sem um craque genial que lidere a equipe tecnicamente, o gol do título tenha surgido de uma rara e brilhante jogada individual. Schürrle varreu a defesa argentina pelo lado direito e achou Götze num raro momento de vacilo defensivo do time de Sabella. O talentoso meia, que havia jogado menos do que sabia durante toda a Copa, entrou para a história fazendo um dos mais lindos gols da história das finais de Mundial, matando no peito e fazendo de voleio. 

O lance do gol de Götze fecha a Copa do Mundo à altura de tudo o que se viu neste mês aqui no Brasil. Um gol de voleio, no Maracanã lotado, fecha uma prorrogação emocionante e coloca mais uma seleção no clube dos tetracampeões mundiais. E a Alemanha há tempos merecia esta conquista, pelo time que tem apresentado nos últimos anos e por todo o espetacular trabalho de reconstrução que fez nesta década, o qual merecia uma conquista deste nível para ficar definitivamente marcado. 

A Argentina, por sua vez, só valorizou esta conquista. Fez uma ótima Copa do Mundo e uma grande final. Alejandro Sabella mostrou nos últimos dois jogos que é, sim, um excelente técnico. Fez seu time jogar de forma competitiva contra duas das melhores seleções do planeta na semifinal e na final da Copa do Mundo mesmo sem Di María, ajeitou sua defesa a ponto de torná-la extremamente sólida e ficou a sete minutos de, quem sabe, levar a Argentina ao título mundial nos pênaltis, após 28 anos de jejum. Mas o fato é que os alemães jogaram um pouco mais hoje, e bem mais no restante do torneio. São os merecidos campeões, um timaço à altura deste inesquecível Mundial do Brasil.

Em tempo:
- Messi não foi o melhor jogador da Copa. Houve ao menos três ou quatro nomes que jogaram bem mais do que ele.

Ficha técnica
Copa do Mundo 2014 - Final
13/julho/2014
ALEMANHA 1 x ARGENTINA 0
Local: Maracanã, Rio de Janeiro (BRA)
Árbitro: Nicola Rizzoli (ITA)
Público: 74.738
Gol: Götze 7 do 2º da prorrogação
Cartão amarelo: Höwedes, Schweinsteiger, Mascherano e Agüero
ALEMANHA: Neuer (8), Lahm (7), Boateng (9), Hummels (6,5) e Höwedes (5,5); Kramer (5,5) (Schürrle, 31 do 1º - 8), Schweinsteiger (7,5) e Kroos (6); Müller (7), Klose (5,5) (Götze, 42 do 2º - 8) e Özil (7) (Mertesacker, 14 do 2º da prorrogação - sem nota). Técnico: Joachim Löw
ARGENTINA: Romero (7), Zabaleta (7), Demichelis (6,5), Garay (8) e Rojo (6); Mascherano (7), Biglia (7), Pérez (6,5) (Gago, 40 do 2º - 5,5) e Messi (6,5); Lavezzi (6,5) (Agüero, intervalo - 6) e Higuaín (5,5) (Palacio, 32 do 2º - 5,5). Técnico: Alejandro Sabella

Comentários

Chico disse…
Panzer, o grande e merecido vencedor da copa.

A seleção argentina teve chances de golo e não aproveitou. Contra o poderoso Panzer, esse erro é inaceitável.

Todas as modificações que Löw procedeu foram acertadas e só melhoraram o time.

Schweinsteiger e Lahm desde 2006 jogando muito.