Mistério e cautela contra o favoritismo

Para enfrentar o melhor time do mundo e ser o dono do planeta pelos próximos quatro anos, Alejandro Sabella pensa certo, como Felipão deveria ter pensado antes da semifinal de terça: povoar o meio-campo. A estratégia não é reflexo da goleada sofrida pelo Brasil no Mineirão. Não se trata de medo da Alemanha, nem de cautela em excesso. É, na verdade, o melhor modo de suprir a ausência de Di María. Isso se ele realmente não jogar, pois até final de Copa do Mundo tem mistério.

Contra a Holanda foi assim. Di María ficou fora, entrou Enzo Pérez. A Argentina perdeu em criatividade, é certo, mas não deixou a Laranja jogar. Naquele jogo, a estratégia cabia bem pelo fato de a formação obrigar o time de Van Gaal a ter mais a bola, algo que esta Holanda de 2014 definitivamente não gosta. Não houve jogo, em termos de oportunidades criadas. Apenas muita ocupação de espaços e pouca inspiração, numa batalha tática que se arrasou até a disputa de pênaltis.

Contra a Alemanha, povoar o meio tem outro sentido. O time de Löw adora ter a bola nos pés, especialmente do círculo central para frente. A ideia de Sabella é formar um paredão a partir dali, já com a linha ofensiva (Higuaín, Lavezzi e Messi) marcando muito. A partir daí, aproveitar que os alemães não fazem marcação individual para, com o melhor do mundo, descolar as oportunidades. Ainda assim, e mesmo sem Di María, a Argentina pode vencer o jogo sem que Messi desequilibre. Basta que Lavezzi e Higuaín joguem mais do que têm jogado ofensivamente. Nesta Copa, o craque do time não foi decisivo contra Bélgica e Holanda, e funcionou.

Nada disso, porém, será suficiente se a equipe platina não tiver uma atuação irrepreensível do ponto de vista tático, técnico e psicológico. A seleção germânica entra com o favoritismo por quatro motivos: ser a seleção efetivamente mais forte (o que não é demérito à Argentina, pois estamos falando do melhor selecionado alemão em décadas); vir de uma vitória fantástica na semifinal; estar completa, ao contrário do time sul-americano; e estar bem mais descansada (teve um dia a mais para se recuperar da semifinal, na qual se cansou pouquíssimo, enquanto a Argentina até aos pênaltis foi contra a Holanda). O ponto fraco da equipe, que era a linha de quatro zagueiros, seu técnico consertou ao passar Lahm para a lateral direita e incluir Khedira, que faz uma Copa espetacular, no meio. Não há ninguém como Messi, mas há Neuer, Hummels, Schweinsteiger, Kroos, Müller, Özil e Klose. Fora os já citados. Fora os do banco. É uma máquina.

E é a melhor final que esta Copa do Mundo espetacular poderia nos proporcionar. Claro que um clássico entre brasileiros e argentinos seria algo especialíssimo, mas o time da casa nunca mostrou futebol suficiente para chegar tão longe. Em vez disso, temos a melhor seleção do planeta contra, provavelmente, a segunda melhor, ou, seguramente, a equipe do maior craque que o futebol produziu nos últimos tempos. Uma final que, hoje, supera Brasil x Itália e se torna a mais repetida da história do maior torneio do futebol mundial. Uma final do tamanho da excelente Copa do Mundo que tivemos o privilégio de acompanhar nos últimos 31 dias.

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