45 minutos (e uma campanha) para a história

É verdade que nenhum time de poucos recursos conseguiu vencer a Liga dos Campeões nos últimos tempos. Mas também é verdade que orçamento não ganha jogo. Este irrepreensível Atlético de Madrid de Diego Simeone é a prova. Não se trata de um clube pobre, muito longe disso, mas a comparação com seus pares não dá nem para iniciar uma conversa neste sentido. Mesmo assim, está muito próximo de ser campeão espanhol após 18 anos de jejum e volta a decidir o maior título do futebol europeu após 40 anos. Onde está o segredo?

São várias as razões para o sucesso da temporada toda, inclusive a qualidade técnica alta da equipe. Ninguém chega à final da Liga dos Campeões invicto só por ser esforçado e dedicado. Porém, nas semifinais diante do Chelsea, sobrou postura ao time madrilenho. Se orçamento não ganha jogo, postura ganha. E ela foi tão digna e grande na noite desta quarta-feira em Londres que surpreendeu até o competentíssimo José Mourinho.

O Chelsea esperava, de fato, que o Atlético se comportasse como ele, Chelsea, se comportou em Madrid: resguardado atrás, esperando um contragolpe. O time madrilenho fez isso diante do Barcelona, no Camp Nou, por exemplo, e repetiu inicialmente esta estratégia, em termos: deixou o Chelsea tomar a iniciativa, mas, ao contrário do time londrino em Madrid, não o chamou para a pressão nunca e sempre teve a arma do contragolpe engatilhada. Na prática, um golzinho em Londres deixaria o Atlético perto da vaga. Um raciocínio lógico, mas que nem todos têm coragem e grandeza de pôr em prática num mata-mata dessa envergadura.

Assim, o primeiro tempo foi chato, parelho, como todos os 90 minutos da semana passada. Quando Fernando Torres abriu o placar, aí sim, o time visitante resolveu tomar o protagonismo de vez. E aí, amigos, é que começou o baile. Koke e Turan assumiram o controle do meio, e achavam com facilidade os sempre perigosos Adrián e Diego Costa mais à frente. Foi em jogada iniciada pelo ótimo lateral Juanfran, porém, que o time espanhol chegou ao empate. Levou apenas oito minutos para igualar o placar e ficar à frente no saldo qualificado. E justamente no último minuto do primeiro tempo. Stamford Bridge estava em festa, mas de repente se calou e viu o Chelsea ir para o intervalo eliminado. O clima pesou bastante.

Até aí, tudo dentro de uma razoável normalidade. O segundo tempo é que foi fora da curva. Mesmo com a vantagem no saldo qualificado, o Atlético resolveu aproveitar o momento psicológico favorável e dominou completamente as ações, do início ao fim, atacando o Chelsea como se estivesse em casa, ou precisando de um gol para se classificar. Quando Diego Costa fez de pênalti o 2 a 1, lance capital da partida, a vantagem no placar já se fazia por merecer há tempos. O Chelsea bem que tentou se atirar para cima, acelerar o jogo com Hazard e Willian, mas parava na defesa mais sólida da Liga dos Campeões e em um setor ofensivo com personalidade tal que seguiu controlando o jogo como se estivesse no Vicente Calderón. O terceiro, de Turan, fechou a conta, caracterizou o baile e fez justiça a um dos craques da noite.

A final será totalmente ibérica. Em Lisboa, Real e Atlético farão Madrid ser a primeira cidade da Europa a ter dois clubes numa mesma final. E quem dá mais pinta de campeão? O Real Madrid deu simplesmente uma surra histórica no campeão mundial fora de casa e conta com o melhor jogador do mundo na atualidade. O Atlético de Madrid não ficou tão atrás, impondo ao Chelsea uma derrota como nunca José Mourinho viu em Stamford Bridge. Pior: para equilibrar mais, estamos falando de um grande clássico, cheio de rivalidade. Em nomes e orçamento, o Real tem mais condições de ser o campeão. Mas orçamento não ganha jogo; postura, ganha. E isso o Atlético de Simeone tem de sobra.

Ficha técnica
Liga dos Campeões da Europa 2013/14 - Semifinal - Jogo de volta
30/abril/2014
CHELSEA 1 x ATLÉTICO DE MADRID 3
Local: Stamford Bridge, Londres (ING)
Árbitro: Nicola Rizzoli (ITA)
Público: 37.918
Gols: Torres 35 e Adrián 43 do 1º; Diego Costa (pênalti) 14 e Turan 26 do 2º
Cartão amarelo: Cahill, Adrián e Diego Costa
CHELSEA: Schwarzer (5), Ivanovic (4,5), Cahill (5,5), Terry (5) e Ashley Cole (5) (Eto'o, 8 do 2º - 4); David Luiz (6), Azpilicueta (5), Ramires (5,5) e Willian (5,5) (Schürrle, 31 do 2º - sem nota); Hazard (5) e Torres (6) (Ba, 22 do 2º - 4,5). Técnico: José Mourinho
ATLÉTICO DE MADRID: Courtois (7,5), Juanfran (8), Miranda (7,5), Godín (7) e Filipe Luís (7,5); Tiago (7,5), Suárez (6), Koke (6,5) e Turan (8) (Rodríguez, 37 do 2º - sem nota); Adrián (7) (García, 20 do 2º - 6,5) e Diego Costa (7,5) (Sosa, 30 do 2º - sem nota). Técnico: Diego Simeone

Comentários

Franke disse…
A seleção espanhola é uma chatice, e é por isso que é tão paradoxal, e legal, que a final da Champions seja disputada por dois times espanhóis que nada têm da chatice federal hispânica. São dois times muito fortes, rápidos, intempestivos, de muita marcação mesclada com verticalidade e objetividade. Têm a ver com o futebol da seleção alemã, e pouco a ver com o Bayern do Guardiola. Tá tudo trocado.
Vicente Fonseca disse…
Hahah, exatamente! Os finalistas espanhóis jogam um futebol alemão e o melhor time alemão joga um futebol espanhol. No fim, é essa mistura toda que torna Alemanha e Espanha, talvez, as duas maiores seleções do mundo no momento.