Charme não; só racionalidade

Começa hoje à tarde o Campeonato Gaúcho mais interessante dos últimos anos. Mas calma: ele pouco tem de "charmoso", nem ganha tanto em importância. Segue sendo um estadual inchado, tanto em número de clubes quanto de datas; segue sendo um campeonato em que um time que disputa um jogo por competição continental numa quinta-feira tem partida inexplicavelmente marcada no estadual para uma segunda; segue tendo um regulamento pouco inteligente e um tanto confuso. Mas já apresenta uma boa melhora em relação aos últimos cinco anos.

Iniciando pelos problemas: a FGF fez o "favor" de desvalorizar a primeira fase ao anunciar que oito dos 16 clubes que a disputam passarão para os mata-matas. Fossem apenas quatro, teríamos uma disputa mais interessante, possivelmente até para a Dupla Gre-Nal, que seria mais exigida em termos técnicos. Ao contrário, os dois grandes poderão colocar seus times sub-23 em talvez metade da fase inicial, mas ainda assim passarão com tranquilidade para as disputas finais. Pior: classificando oito, obriga-se a realização de uma etapa de quartas de final. Por falta de datas, tanto as quartas quanto as semifinais ocorrerão em jogo único, algo de que ainda não nos livramos e poderia ser solucionado com a passagem de apenas quatro dos 16 às fases decisivas.

Pior ainda é a desnecessária divisão entre dois grupos de oito equipes, em vez de um só de 16. Por que dar a possibilidade de uma equipe se classificar tendo obtido menos pontos que outra? Se os jogos ocorressem dentro dos próprios grupos, até faria sentido. Sem isso, fica apenas o formulismo pelo formulismo. Mas enfim, dado o regulamento do Campeonato Paulista, nem podemos reclamar.

E não é mesmo ano de reclamar: apesar de ainda inchado, o Gauchão 2014 será melhor que o de 2009, 2010, 2011, 2012 e 2013. Não só por ser um pouco mais racional em termos de tamanho (e o de 2015 será ainda mais adequado, com a promessa de 12 clubes), mas pelos clubes que o disputam. Nada contra o honroso Cerâmica (e bem mais contra Canoas ou Porto Alegre), mas o retorno de Aimoré, Brasil e São Paulo-RS é ótimo para a competição. Teremos mais clubes tradicionais, de comunidades que há tempos andavam distantes da elite do nosso futebol, e são muito representativas, especialmente Rio Grande, berço do futebol nacional.

A distribuição geográfica dos participantes, se não é a ideal, ao menos é um pouco mais bem distribuída. Serão menos times do eixo Serra-Capital, e mais times do Sul. A volta do Bra-Pel após 15 anos já é fantástica para o campeonato. Falta ainda alguém da fronteira, mas quem sabe não estamos a caminho? Um regulamento classificatório regionalizado talvez resolvesse isso. Se a FGF anda se dando conta de algumas coisas que há tempos estavam erradas, talvez possa se dar conta disso também. Embora coerência não seja exatamente algo que podemos esperar de Noveletto, o rei da memória curta.

Favoritos? Grêmio e Inter, claro. O Tricolor entra melhor, com time mais consolidado e elenco mais numeroso, promete dar maior atenção ao estadual que no ano passado, mas na hora em que a Libertadores afunilar é difícil prever o comportamento: priorizar a competição continental ou dar atenção ao estadual? É a eterna questão. O Inter, já sem tanta qualidade no grupo, terá o Beira-Rio de volta e a prioridade total ao Gauchão nesses primeiros meses do ano. Bem parecido o cenário com o de 2013. Candidatos a surpresas também há muitos: a Dupla Ca-Ju, a Bra-Pel, o Aimoré, o Novo Hamburgo, Lajeadense, Passo Fundo, Veranópolis, São Luiz...

Não se trata de um grande campeonato, da fórmula definitiva, da certeza de dias melhores, mas será um Gauchão mais racional e no rumo para, quem sabe, entrarmos numa era mais enxuta do nosso estadual. Isso já é motivo para comemorar, depois de cinco anos de inúmeros mata-matas sem grande importância, termômetro definindo realização de jogo, partida cancelada por falta de interesse dos clubes em disputá-la e grandes clubes tratando o campeonato como um grande estorvo.

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