O homem certo no lugar errado

Quando Mano Menezes recebeu o chamado para ser técnico da seleção brasileira, a esperança que eu tinha era a de que ele fosse um freio ao afã nacional pelo ofensivismo. O fim da Era Dunga, na derrota para a Holanda, causou aquele maldito pensamento mágico de que "agora sim veremos o futebol brasileiro", "precisamos jogar com alegria", "chega de volantes", "chega de sisudez". O anúncio de Mano, de certa forma, era reconfortante. Sua trajetória sempre foi a de montar times de trás para frente, um processo de construção, pouco festivo e muito criterioso. Poderia contrabalançar um pouco o festerê irresponsável pelo "futebol moleque".

Nada disso aconteceu. Mano Menezes caiu ontem à tarde, após 27 meses de trabalho, de forma mais que merecida. Afinal, em nenhum momento vimos na casamata da seleção o Mano do Grêmio, do Corinthians, do 15 de Novembro ou do Caxias. Em nenhum momento vimos aquele homem cheio de ideias, aquele estrategista que sabia tirar de jogadores como Patrício, Wellington, Ramon e Nunes um time que chegasse às cabeças do Campeonato Brasileiro e da Libertadores. Mano Menezes nunca foi Mano Menezes na seleção. Acabou engolido por um pensamento que nunca foi o seu. Por isso o time nunca convenceu, e por isso ele caiu hoje. Porque era o homem certo, no lugar e na hora erradas.

É claro que ele não é vítima, não estamos tentando dizer isso. Mano Menezes é um homem muito astuto, inteligente, que sabe fazer o meio-campo entre dirigentes e jogadores como poucos. Tentou implantar a filosofia que lhe foi passada, talvez para ter tranquilidade e tentar ganhar o apoio da CBF, da torcida e da mídia, só que, no fundo, ele não acreditava em nada do que fazia. A Era Mano, pegando por seu currículo, tinha tudo para ser parecida com a Era Dunga, mas sem tanta teimosia e com uma relação mais harmoniosa com a imprensa. Em vez de apostar em suas convicções, fincar pé no que acredita, fez o jogo do "pão e circo": muitos atacantes, poucos volantes, muita gurizada, nada que remetesse a 2010. Quando o ideal seria uma transição mais amena, aproveitando as boas coisas que Dunga deixou. Não foram poucas. E seriam úteis para Mano implantar a sua filosofia a seguir, como a recente titularidade de Kaká tem comprovado.

A CBF, dizem, vai agora atrás de Luiz Felipe. É bom que saibam o que estão comprando: Felipão não se curvará à ânsia nacional pelo "espetáculo". Já deixou Romário de fora de uma Copa do Mundo, contra a vontade de 95% do país. É um técnico de convicções, personalidade. Formará um time, como Dunga fez. Seria uma volta ao trabalho criterioso, que vimos de 2006 a 2010. É mesmo a melhor opção, que escancararia o fato de que jogar fora tudo o que Dunga fez é uma infantilidade, com a qual estamos pagando o preço de termos perdido dois anos de preparação para a Copa de 2014. Mas a CBF precisa estar pronta para bancar o gringo, pois ele receberá a antipatia nacional, mesmo que tenha o pentacampeonato no currículo. Não sei se Marin estaria disposto a isso, ou mesmo se quer este tipo de trabalho na seleção brasileira. Se é que ele sabe o que quer, sejamos francos.

Se a ideia é fazer um time mais leve, com um clima mais ameno, o técnico ideal acaba de se tornar o quarto na história, ao lado de Carpegiani, Telê e Autuori, a ostentar Brasileiro, Libertadores e Mundial no currículo: Abel Braga. Exatamente. Não é um grande estrategista, não tem os conhecimentos táticos e os métodos de Felipão e Mano Menezes, mas é um excepcional administrador de vestiários, possui um estilo primordialmente ofensivo, sabe controlar estrelas e deu mostras, com o Fluminense, de que aprendeu também a montar seus times de trás para frente, sem deixá-los com isso retrancados. Evoluiu muito como técnico nos últimos anos.

Abelão é a bola da vez, e é preferível um técnico que trabalhe acreditando no que faz do que ter alguém que tenta implantar um estilo que nada tem a ver com o que este profissional realmente pensa. Muricy e Felipão, se tiverem personalidade, serão Muricy e Felipão, ou seja, a antítese do que a CBF quer. Se forem como Mano, que não teve personalidade e tentou entrar no jogo da "alegria", fracassarão como o gaúcho do Passo do Sobrado. O Mano Menezes que a gente conhece nunca foi técnico da seleção brasileira. Por isso, fracassou.

Rumo ao hexa?
Esta é a primeira vez em 11 anos que a seleção demite um técnico em meio a um período entre Copas do Mundo. De 2002 a 2006, Parreira teve quatro anos para trabalhar. De 2006 a 2010, Dunga dispôs do mesmo período. Nenhum dos dois levou a Copa. Zagallo, de 1994 a 1998, também não conseguiu. Já Parreira substituiu Falcão em agosto de 1991, três anos antes da Copa, e ganhou. Felipão substituiu Leão em julho de 2001, e ganhou o Mundial de 2002. Trocar de técnico no meio do caminho costuma dar sorte ao Brasil, curiosamente.

Em tempo:
- Abre-se caminho para Mano Menezes ser contratado pelo Internacional. Não se enganem com o histórico ruim na seleção. Seria uma grande contratação, com tudo para dar certo.

Comentários

Rodrigo Cardia disse…
"Trocar de técnico no meio do caminho costuma dar sorte ao Brasil, curiosamente."

Em 1970 também foi assim - aliás, bem mais em cima da hora. O Saldanha foi demitido três meses antes da Copa...