Um mito gaúcho do terceiro milênio

A troca de técnico do Grêmio em meados de fevereiro reacendeu a discussão a respeito do planejamento do clube. Nos 11 anos em que está sem ganhar títulos importantes, o Tricolor vai para seu 18º técnico. Número altíssimo: em média, um treinador não dura mais que oito meses no Estádio Olímpico, desde janeiro de 2001.

Mas e o Inter? Campeão de quase tudo nesta década (só faltam Brasileirão e Copa do Brasil), o Colorado exibe galeria de troféus estupenda nestes 11 anos de jejum gremista. Quantas vezes o Internacional apostou na continuidade do trabalho de um técnico, favorecendo um planejamento para uma temporada?

Abaixo, uma linha do tempo de chegadas e demissões de treinadores da Dupla de 2001 para cá. Não fazem parte da conta os interinos:

Janeiro/2001: Grêmio abre sua temporada apostando em Tite. Inter continuou com Zé Mário, técnico no ano anterior.
Abril/2001: Zé Mário cai devido à má campanha no Gauchão. Em seu lugar, assume Cláudio Duarte.
Junho/2001: após o período tampão de Claudião, o Inter contratar Carlos Alberto Parreira para o Campeonato Brasileiro.
Janeiro/2002: Ivo Wortmann começa o ano dirigindo o Inter. Tite segue firme no Grêmio.
Maio/2002: a péssima campanha na Copa Sul-Minas derruba Ivo. Inter efetiva o auxiliar Guto Ferreira, que ganha o Gauchão no início de junho.
Agosto/2002: Guto não resiste ao mau começo no Brasileiro. Celso Roth é chamado.
Novembro/2002: com o time quase na zona de rebaixamento, Roth é demitido. Chega novamente Cláudio Duarte, que salva o Inter da queda.
Janeiro/2003: Tite inicia sua terceira temporada no Grêmio. Muricy Ramalho é a nova aposta do Inter. Durante a Era Tite, Inter teve oito técnicos em dois anos e meio.
Junho/2003: desgastado, Tite deixa o Olímpico. O uruguaio Darío Pereyra assume.
Julho/2003: em menos de um mês, Darío é demitido. Chega Nestor Simionato ao Grêmio.
Agosto/2003: Nestor sai com quatro semanas de trabalho. Adílson Batista chega e salva o time de um rebaixamento tido como certo.
Janeiro/2004: Muricy deixa o Inter após não conseguir classificar o time para a Libertadores. Lori Sandri é o novo técnico.
Junho/2004: eliminado no Gauchão, Adílson deixa o Grêmio. Entra José Luiz Plein.
Julho/2004: Lori Sandri é demitido do Inter, dando lugar a Joel Santana.
Setembro/2004: troca nos dois lados. Plein deixa o Grêmio, que contrata Cuca. No Inter, sai Joel e volta Muricy Ramalho.
Outubro/2004: Cuca deixa o Grêmio quase rebaixado. Cláudio Duarte tenta o milagre, mas não evita a queda para a Série B.
Janeiro/2005: Grêmio inicia projeto para subir com Hugo de León.
Abril/2005: De León deixa o cargo às vésperas da estreia na Série B. Começa a Era Mano Menezes.
Janeiro/2006: vice-campeão brasileiro, Muricy vai para o São Paulo. Abel Braga assume o Inter. É o único ano em que ambos os grandes gaúchos não trocam de técnico.
Abril/2007: eliminado da Libertadores e do Gauchão, Abel deixa o Inter. Alexandre Gallo assume o posto.
Agosto/2007: Gallo sai, desgastado. Volta Abel Braga.
Janeiro/2008: após três anos de Mano Menezes, Grêmio aposta em Vagner Mancini.
Fevereiro/2008: Mancini deixa o cargo invicto, por não agradar o estilo dos dirigentes. Celso Roth volta ao Grêmio, sete anos e meio depois.
Junho/2008: Abel deixa o Inter e vai para o Mundo Árabe. Assume Tite.
Abril/2009: após várias derrotas seguidas em Gre-Nais, Roth cai no Grêmio. Após um mês sem técnico (Rospide assume, interino), Tricolor contrata Paulo Autuori.
Outubro/2009: Tite deixa o Inter. Mário Sérgio assume, contrato curto.
Novembro/2009: Autuori deixa o Grêmio. Com mais um mês com Rospide na interinidade, clube contrata Silas, que assume em janeiro.
Janeiro/2010: dois técnicos novos: Silas no Grêmio e Jorge Fossati no Inter.
Maio/2010: Fossati deixa o Inter. Vinte dias depois, em junho, Celso Roth assume.
Agosto/2010: Silas deixa o Grêmio e o ídolo Renato Portaluppi é o novo técnico.
Março/2011: Celso Roth é demitido do Inter. O ídolo Paulo Roberto Falcão é contratado.
Julho/2011: trocas nos dois lados. No Grêmio, sai Renato e entra Julinho Camargo. Semanas depois, Falcão deixa o Inter, que fica um mês com o interino Osmar Loss e depois traz Dorival Júnior.
Agosto/2011: Julinho deixa o Grêmio, após má campanha. Celso Roth chega para evitar o pior.
Janeiro/2012: Grêmio inicia o ano com Caio Júnior. Inter mantém Dorival.
Fevereiro/2012: Caio Júnior é demitido e Grêmio deve contratar Vanderlei Luxemburgo.

É só fazer as contas: enquanto o Grêmio irá para seu 18º técnico em 11 anos, Dorival Júnior é o 20º treinador colorado no período. Se no Olímpico um técnico não dura oito meses, no Beira-Rio a média é de seis meses e meio.

O Grêmio ainda tem a seu favor o fato de ter tido dois técnicos que permaneceram mais que dois anos seguidos no clube (Tite, entre 2001 e 2003, e Mano Menezes, entre 2005 e 2007). No Inter, o máximo de permanência foram os 18 meses de Tite (2008-2009) e os 16 meses de Muricy Ramalho (2004-2005) e Abel Braga (2006-2007).

Se o recorte for o início da crise institucional do Grêmio, em janeiro de 2003, a diferença fica maior: foram 18 técnicos pelo lado gremista e 12 do Inter. A média de permanência no Olímpico nos últimos nove anos cai para 6 meses. No Beira-Rio, de 2003 para cá, um técnico dura em média nove meses.

Se o recorte for o início do período glorioso do Inter, em 2006, foram nove técnicos comandando o Colorado nestes seis anos, contra 10 do Grêmio. Desde que Mano Menezes deixou o Olímpico, o Grêmio já teve oito técnicos. O Inter, neste mesmo período, teve seis.

Números bastante parecidos, para resultados bem diferentes. Mas uma conclusão é óbvia: técnico só permanece quando apresenta resultados. Dificilmente uma direção banca a permanência de um profissional por longo tempo se ele começa a perder. As exceções foram Mano Menezes e seu começo difícil no Grêmio e Tite e sua imensa rejeição pela torcida do Inter.

E outra, bastante óbvia, é que não está na permanência dos técnicos a razão do sucesso do Inter. Mas que as constantes trocas têm atrapalhado o Grêmio, não resta dúvida.

Comentários

Unknown disse…
Parabéns pela análise, Vicente!
Por isso, que eu só leio sites independentes, como o teu! Isso jamais sairia em zh, clicrbs, cp, globo.com e tais... ou pode sair como plágio descarado?
Duvido, porque essa comparação não é interessante que seja divulgada, pois nos sites citados anteriormente o objetivo não é informar, e sim alienar.
E quanto ao Luxemburgo, porque não pode dar certo? Olha como a imprensa "oficial" age: O caio Jr era novo e sem títulos de expressão. Não servia.
Aí vem o Luxemburgo, raposa velha, cheia de títulos (Pô, o cara é PENTA-campeão Brasileiro! Tem a mesma quantidade de títulos da dupla grenal junta!)e também não serve. Motivo: Faz tempo que não ganha nada!!! Querem o que? O Mourinho? O Guardiola? Façam-me o favor, né?
Deixem o homem trabalhar...
Abraço e parabéns de novo pelo belo post!
Alisson.
Vicente Fonseca disse…
Alisson, muito obrigado pelos elogios. É sensacional receber o reconhecimento de vocês. :)

Também acho que tem que deixar o homem trabalhar. Pode dar certo, pode não dar. Não é a mística ou o passado que definirão isso, tampouco a simpatia ou antipatia pela figura dele.

Abração!
Anônimo disse…
É verdade isso, mas acho que o proprio Inter se tivesse dado mais tempo aos seu treinadores teria tido resultados ainda melhores muito provavelmente, não acha?
Lourenço disse…
Análise totalmente arrebatadora contra as matérias simplistas que não se dão ao trabalho de fazer uma análise sequer com o principal adversário, que se dirá em âmbito nacional.