Ano que vem não tem superclásico

RIVER PLATE 1 x 1 BELGRANO
Estive ano passado no Monumental de Nuñez. Tudo me impressionou, mas duas coisas em especial: a grandiosidade da construção, do clube, o Club Atlético River Plate, por um lado; e a decadência, de outro. Os olhares de todos os funcionários eram tristes, preocupados, pareciam prever o que ocorreria 14 meses depois. As dependências estavam em estado precário, talvez pela fase econômica complicada porque passa a Argentina nas últimas décadas, mas muito porque o próprio River era uma sombra do que já foi.

O River Plate coroou hoje, às 16:53, horário de Brasília e Buenos Aires, a pior crise de sua história. O time de Nuñez não caiu hoje: vem caindo há muitos anos. Começou com a inacreditável lanterna no Apertura 2008, um semestre após ter conquistado o título de campeão argentino, comandado por Belluschi, Buonanotte e Loco Abreu. Aquele foi o torneio onde tudo começou, não agora. Houve campanhas ruins (13º, 14º) entremeadas com outras medianas (8º, 9º). O promédio permite ao clube grande se reestruturar ainda na primeira divisão, o protege de uma temporada infeliz. Mas cobra um preço: o da necessidade de recuperação. O peso de uma temporada ruim é carregado nas costas por três anos. O River não caiu em 2008 por causa do promédio, mas caiu em 2011 por causa do promédio.

O time atual não é o pior da história do River Plate. Nestes três anos de desgraças e nervosismo, houve piores. No começo deste ano, o time de Nuñez chegou a liderar por algumas rodadas, brigou pelo título. Não era algo maravilhoso, era necessário. Sabia-se que para compensar a série de anos ruins o time teria que ficar na ponta de cima. O 2 a 1 sofrido para o Godoy Cruz, em pleno Monumental, retirou a equipe do entrevero de cima. Houve a vitória no clássico contra o Racing. Foi a última. Na sequência, foram duas derrotas pesadas: 2 a 0 para o modesto All Boys, em casa, e para o Boca, no superclásico. O River teve jogos ganháveis dali até o fim, mas empatou com Olimpo e Colón, entregou uma vitória em La Plata para o desinteressado Estudiantes e, claro, levou 2 a 1 do Lanús em Buenos Aires. Sete jogos sem vitória, um mais nervoso que o outro.

A Promoción, que começou quarta, com choro, e terminou hoje, com mais choro, foi a cereja do bolo. O River Plate apenas refletiu o que foram seus últimos anos: um time nervoso, desarrumado, que vai muito no ímpeto e pouco na organização e na qualidade. O pênalti perdido por Pavone foi o resumo dos três piores de seus 110 anos num único chute. O time atual é um dos mais aguerridos de sua história. Foi uma equipe que tentou reverter um quadro extremamente desfavorável, mas foi incompetente. Não faltou gana, não faltou esforço. Todos choraram ao fim da partida, um choro visivelmente sincero. Faltou, mesmo, futebol.

A recuperação do River Plate talvez já tenha até começado. Sua torcida deu espetáculo, empurrou o time para cima do modesto Belgrano, que é inferior, mas não jogava a vida, e sim a glória - por isso, entrou mais tranquilo. Todos se unirão em torno da causa. Já estão unidos, aliás. Passado o desespero, virá a mobilização. Claro, não dá para ficar apenas nisso. O River precisa de uma mudança bem mais profunda, em todos os níveis.

O Club Atlético River Plate, campeão do mundo, bicampeão da América, maior campeão argentino (36 títulos), senhores, caiu para a Segunda Divisão. Em pleno Monumental de Nuñez. Faz pouco mais de uma hora. Estamos, ainda, vivendo a história.

Em tempo:
- Somente Boca Juniors e Independiente não caíram ainda.

- Tarde mais triste da história do Monumental de Nuñez, superando Argentina 0 x 5 Colômbia, em 1993. Há uma Copa América logo ali, para acabar com o gosto amargo. A albiceleste não ganha nada há 18 anos.

Foto: Olé.

Comentários

Igor Natusch disse…
Interessante ver como a história da dor para o River Plate acaba sendo a mesma de muitos clubes grandes que desabam para séries inferiores. Somando administrações perdulárias e/ou francamente incompetentes com a sede de lucro de algumas corporações e a contratação desastrada de alguns incompetentes em áreas-chave do plantel e da comissão técnica, temos o resultado prático: um time grande na segunda divisão. Foi assim com Grêmio, Corinthians, Vasco da Gama, Fluminense... E ninguém está imune. Ninguém.

A narração da Rádio Mitre é de arrepiar - e vem acompanhada, neste artigo do Impedimento, de excelente texto: http://impedimento.org/2011/06/26/de-rato-en-rato-me-toco-el-pecho-la-herida-me-duele-mas-y-mas/