Os mitos e clichês nos mata-matas da Libertadores

O arrasador Cruzeiro de 2011: favoritismo ganha título?
Os líderes de grupo na Libertadores têm a vantagem de decidirem em casa a segunda partida do mata-mata nas oitavas de final. Mas será que esta vantagem é mesmo representativa?

O Carta na Manga averiguou os últimos dez anos de mata-matas na Libertadores para tirar uma conclusão mais concreta sobre isto. Qual a colocação do campeão continental na primeira fase da competição? Quantos líderes de grupo se classificaram nas oitavas de final? Quantas vezes o primeiro colocado no geral da fase de grupos foi o campeão? Em quantos mata-matas o time que decidiu em casa levou a melhor?

Pegamos as últimas dez edições, descontando apenas a de 2004, que classificava 18 equipes em vez de 16 para as oitavas. A amostra é de 2000 a 2010.

2000
1º colocado: América de Cali, eliminado logo nas oitavas pelo América mexicano.
Campeão: Boca Juniors, 3º da primeira fase
Vice: Palmeiras, 6º colocado da primeira fase
Mata-matas vencidos por quem decidiu em casa: 9/15 (60%)

2001
1º colocado: Vasco, eliminado nas quartas pelo Boca Juniors
Campeão: Boca Juniors, 4º colocado da primeira fase
Vice: Cruz Azul, 7º colocado da primeira fase
Mata-matas vencidos por quem decidiu em casa: 10/15 (67%)

2002
1º colocado: América/MEX, eliminado nas semifinais pelo São Caetano
Campeão: Olímpia, 8º colocado da primeira fase
Vice: São Caetano, 4º colocado da primeira fase
Mata-matas vencidos por quem decidiu em casa: 10/15 (67%)

2003
1º colocado: Corinthians, eliminado logo nas oitavas pelo River Plate
Campeão: Boca Juniors, 10º colocado na primeira fase
Vice: Santos, 2º colocado na primeira fase
Mata-matas vencidos por quem decidiu em casa: 8/15 (53%)

2005
1º colocado: River Plate, eliminado nas semifinais pelo São Paulo
Campeão: São Paulo, 5º colocado na primeira fase
Vice: Atlético/PR, 11º colocado na primeira fase
Mata-matas vencidos por quem decidiu em casa: 8/15 (53%)

2006
1º colocado: Vélez Sarsfield, eliminado nas quartas pelo Chivas
Campeão: Internacional, 2º colocado na primeira fase
Vice: São Paulo, 4º colocado na primeira fase
Mata-matas vencidos por quem decidiu em casa: 10/15 (67%)

2007
1º colocado: Santos, eliminado nas semifinais pelo Grêmio
Campeão: Boca Juniors, 11º colocado na primeira fase
Vice: Grêmio, 7º colocado na primeira fase
Mata-matas vencidos por quem decidiu em casa: 6/15 (40%)

2008
1º colocado: Fluminense, vice-campeão derrotado pela LDU
Campeão: LDU, 11º colocado na primeira fase
Vice: Fluminense, líder geral da primeira fase
Mata-matas vencidos por quem decidiu em casa: 7/15 (47%)

2009
1º colocado: Grêmio, eliminado nas semifinais pelo Cruzeiro
Campeão: Estudiantes, 10º colocado na primeira fase
Vice: Cruzeiro, 5º colocado na primeira fase
Mata-matas vencidos por quem decidiu em casa: 6/13 (46%)

2010
1º colocado: Corinthians, eliminado logo nas oitavas pelo Flamengo
Campeão: Internacional, 6º colocado na primeira fase
Vice: Chivas, 13º colocado na primeira fase de 2009
Mata-matas vencidos por quem decidiu em casa: 8/15 (53%)

Vale à pena ser líder geral da primeira fase?
Em tese sim, mas notem que nenhum dos dez líderes gerais foi campeão. Três deles nem passaram pelas oitavas, e somente um chegou à final, sendo vice-campeão. Em 50% dos casos, o líder geral chegou pelo menos à semifinal. É o maior índice de todas as colocações, ao lado do 6º lugar.

Vale à pena ser líder de grupo?
Seis dos 10 campeões foram líderes de seus grupos na primeira fase. Este dado conta a favor de quem é vice-líder, pois 40% é uma proporção alta. Em 31 dos 78 mata-matas (40%), o líder de grupo caiu logo nas oitavas de final. Isso vai ao encontro da tese de que ser líder de um grupo difícil pode até diminuir a pontuação desta equipe, mas lhe dará maior resistência na hora de disputar os jogos eliminatórios, devido à forte exigência inicial.

De onde saiu o campeão?
O 10º e o 11º lugares da fase inicial foram campeões duas vezes cada. Curiosamente, o lugar de dois vice-líderes são os mais frequentes na lista de campeões. Em 2011, são Vélez e Grêmio. Do 2º ao 6º lugar, além do 8º colocado, cada um foi uma vez campeão.

Qual colocado foi mais vezes finalista?
O 4º colocado (em 2011, Atlético Júnior) e o 11º (Grêmio) participaram de três finais cada. O 9º, o 12º e do 14º ao 16º, nenhuma vez.

E a vantagem de jogar a segunda partida em casa? Existe?
NÃO. Dos 148 mata-matas nos últimos dez anos, 82 foram vencidos por quem jogou a segunda partida em casa (55%), contra 66 dos que decidiram como visitante (45%). A diferença é pequena, e há um dado que precisa ser levado em conta: especialmente nas oitavas de final, o time que decide em casa normalmente é tecnicamente superior. Não é necessariamente por jogarem a partida de volta em casa que se classificaram, mas porque são mesmo melhores. Vejam como nas fases mais agudas, onde o nível técnico é mais parelho, o índice de classificação de quem decide como mandante cai drasticamente.

Índice de classificação do mandante do segundo jogo em cada fase da competição:


Oitavas de final: 47/78 (60,3%)
Quartas de final: 25/40 (62,5%)
Semifinais: 6/20 (30,0%)
Final: 4/10 (40,0%)

Conclusões
Não é clichê: mata-mata é outra Libertadores, completamente diferente. O mando de campo na segunda partida pouco significa, especialmente nas fases mais agudas. Até mesmo ser líder de grupo não é sinônimo de título: é quase meio a meio o número de títulos para líderes ou vice-líderes da fase inicial.

Portanto, para quem acha que o Cruzeiro é o favoritaço e descarta Grêmio, Vélez, Estudiantes ou Fluminense por causa da primeira fase, só tenho um conselho: muita, mas muita calma. A Libertadores, mesmo, começa a partir de terça que vem.

Foto: Folha de São Paulo.

Comentários

Lique disse…
excelente análise, professor! é exatamente o que eu queria dizer, provado em números. toda imprensa brasileira tinha que ler isso pra entender a libertadores, parar de falar em altas vantagens ao decidir em casa e sobre grupos "fracos" onde o primeiro termina com 10 pontos.
Vicente Fonseca disse…
Importante salientar que foi tu que a pediu, Lique. Quando vocês solicitam alguma análise importante, o blog cresce. Valeu pelo elogio, cara!