Dez anos depois

Ronaldinho se despediu do Grêmio em 25 de janeiro de 2001. Marcou um golaço de falta na vitória de 2 a 1 sobre o Figueirense. Em vez de aplausos pela bela jogada, vaias. Muitas. Estava claro, ali, que ele saía do Estádio Olímpico pela porta dos fundos, como persona non grata. Estendeu-se um imbróglio que o deixou seis meses sem jogar. Gremistas comemoraram, queriam vê-lo pelas costas. Nove anos depois, seu irmão e procurador Assis, ex-jogador do Grêmio, foi vaiado no amistoso de despedida de Danrlei. Estava claro que a ferida, para muitos, ainda não tinha cicatrizado. A derrota do Barcelona para o Internacional, no Mundial de 2006, foi a chance perdida pelo craque de recuperar seu prestígio junto à torcida tricolor.

Não gosto de comentar contratações antes que elas se concretizem, porque assim acabo contribuindo com as especulações de um período do ano muito chato, onde elas brotam de hora em hora. Mas uma possível volta de Ronaldinho ao Grêmio é assunto que nunca saiu de pauta, desde aquele 25 de janeiro de 2001. E divide opiniões, entre os que querem vê-lo de volta, lembrando dos gols em Gre-Nais e dos lances geniais, e aqueles que não o desejam recebê-lo nem pintado de ouro e coberto com diamantes.

Seja como for, é preciso tratar a questão com racionalidade. O retorno do craque dentuço ao seu berço posteriormente renegado é um negócio de dimensões estratosféricas. Não pode ser pensado com cabeça quente e paixões à flor da pele. A experiência anterior não deve levar os gremistas necessariamente à raiva: deve, sim, servir de recado que é preciso tomar todo o cuidado em uma negociação com Ronaldinho e Assis, pessoas que se mostraram ardilosas há exatamente uma década.

Embora o primeiro momento seja sempre marcado pelo sentimento de rancor com o que ocorreu em janeiro de 2001, refletir me faz pensar justamente o contrário. E não elencarei argumentos do tipo “é hora de ele reatar relações com a torcida” ou clichês como “todos merecem uma segunda chance”, “o Grêmio é a casa dele”. Vamos pensar em custos e benefícios, rendimento dentro do campo. Se Ronaldinho e Assis foram pragmáticos lá atrás, é hora de o Grêmio sê-lo agora.

Vamos primeiro para dentro de campo, que é o que mais importa (ou deveria importar). Ronaldinho tem 30 para 31 anos. Longe está de ser um jogador acabado, mesmo que o vigor da juventude não volte mais. Mesmo assim, sua qualidade técnica é tão absurda que o normal é ele sobrar em gramados brasileiros. Não porque o Campeonato Brasileiro seja inferior aos nacionais de Espanha e Itália, pelo contrário, é um campeonato de nível mais alto. Mas aqui não há problema algum de adaptação, as regras são menos rígidas. Em vez de vislumbrar um fracasso e atuações apagadas, é muito maior a chance de que Ronaldinho repita os casos recentes de Adriano e, especialmente, Robinho. Dentro de campo, os resultados são incontestáveis.

Se a vida fora de campo é problema, Renato Portaluppi é mais malandro que ele. Sua tarefa em 2011 não será a do linha dura que enfrentará o medalhão. Será a de 2010, quando recuperou Douglas e o fez jogar tudo o que sabe e ainda dar carrinhos, necessários ou não. Ronaldinho é um gênio do futebol, tem mesmo que jogar. O time não ficará obrigatoriamente mais aberto com sua presença. Se permanecer o mesmo que chegou em quarto lugar no Brasileirão, basta passar Lúcio para a lateral. Seria, grosseiramente falando, trocar a presença de Fábio Santos no time pela de Ronaldinho. Sem comentários.

A rejeição da torcida existe e é justa, mas não deve se constituir em um empecilho que inviabilize sua volta. Todas as interativas feitas no último sábado indicam mais de 70% de aprovação à contratação. Esta parcela mais resistente da torcida não será conquistada por planos de marketing. Todos viveram aquele período conturbado, e não será a presença de Ronaldinho em peças especiais produzidas pelo Grêmio que os farão mudar de opinião. Estes, ele terá que conquistar jogando bola, destruindo partidas, decidindo Gre-Nais, ganhando títulos.

E aí entra mais um ponto favorável à volta de Ronaldinho: embora seja um supercraque, duas vezes melhor do mundo, ele precisa provar. Tanto ele como Assis, como Odone e Vicente, reconhecem que há rejeição à sua figura. Portanto, mesmo sendo uma grande estrela, que sofrerá assédio incomensurável, Ronaldinho precisará dar retorno dentro de campo. Se não, sofrerá com as vaias. Mesmo sendo cria do Grêmio e posteriormente tenha traído a confiança do clube, ele sabe que um retorno ao Olímpico é sua grande chance de acabar em paz com o time que o projetou mundialmente. Se ele se importa um mínimo que seja com o Tricolor, precisará dar boa resposta.

Quanto ao marketing, nem há o que discutir dos benefícios. Quando patrocinadores propõem aumentar suas cotas em 400% para manterem seus contratos com o Grêmio é porque realmente é um grande negócio. Só não se pode é priorizar ações de marketing em vez do futebol. Ronaldinho só será sucesso em seu retorno ao Olímpico se jogar um grande futebol. Não precisa ser (nem tenham a ilusão de que será) o do Barcelona.

Outro problema, claro, é levantar dinheiro suficiente para que o Grêmio não tenha prejuízos financeiros. Pagar R$ 10 milhões é fora da realidade. R$ 1 milhão por mês de salário, só com patrocínio. Não faltarão interessados, imagino.

Enquete
A inevitável enquete já está disponível. Por favor, deixem apenas os gremistas votarem.

Comentários

Sancho disse…
Eu, sinceramente, não tenho resposta para a enquete. É um jogador de talento, mas que perdeu o tesão por jogar. Não sei se vale o preço.

Sobre a saída dele, ele jogou até o último dia de contrato. Se não quis renová-lo, foi por culpa da direção, pura e simples. Contratou astradas e amatos por fortunas e negou valorizar o prata-da-casa por achar que ele não poderia ir embora. Quando se deram conta, não havia volta.

Ademais, há boatos que se aproveitaram dessa história de que foi "de graça" para fazer com que o dinheiro desaparecesse no meio do Atlântico. se for verdade que quem contratou, pagou, a história fica ainda mais cabeluda em favor dos Moreira. Como ninguém é inocente nessas histórias, eles provavelmente não falam nada porque receberam também para ficarem quietos.

Pelo sim, pelo não, dinheiro à parte, ainda que seja mentira, acho que a birra da torcida é despropositada. Se há alguém para ser "birrado" é Guerreiro...
Igor Natusch disse…
Também não consigo responder a enquete. Se a pergunta é se eu QUERO que Ronaldinho volte ou não, a resposta é "não". Agora, se a pergunta tem a intenção de apurar se eu APOIO o esforço para trazer Ronaldinho de volta, eu possivelmente marcasse "sim"...

Tem que ficar claro, de qualquer modo, que estamos tratando de uma aposta. A tendência é de que ele tenha um ótimo desempenho nos gramados do Brasil, mas não sei se a vontade de redimir-se no Grêmio existe de fato - e, se existe, se será tão intensa a ponto de fazer com que ele saia da pasmaceira atual. É um investimento caríssimo e com doses de risco, mas eu acho que Odone e cia estão fazendo certo em tentar - e, se os Assis Moreira envolvidos tiverem um mínimo de sangue nas veias, farão considerável esforço para que dê certo também. Ronaldinho ganhar a América e levar o time ao Mundial seria uma maneira simplesmente fantástica de se redimir pelas cagadas do passado. Que sim, tiveram grande responsabilidade deles, com certeza - afinal, um cidadão que diz que não vai embora e logo depois embarca no avião não pode ser visto como exemplo de boa conduta.
Vicente Fonseca disse…
Um esclarecimento.

Muitos dos que conviveram comigo nestes 10 anos (a maioria de vocês) sabem que nunca quis ver Ronaldinho perto do Olímpico depois daquilo. Inclusive participei de uma enquete no pré-jornada da Gaúcha, ano passado, sobre isso - votei NÃO.

No entanto, este texto foi feito com um distanciamento desta paixão. Por isso, não estranhem que eu esteja me posicionando a favor. Sigo achando o cara um pulha, mas racionalmente acho que é uma aposta com grandes chances de dar certo.
Igor Natusch disse…
Para mim, ao menos, está bem clara a tua posição, Vicente. E concordo com ela.

Tanto que acabei de votar "sim" na enquete =P
Lique disse…
se eu quero que o ronaldinho jogue pelo gremio, claro que quero. se acredito? duvido muito. acho que ele, se sair do milan, vai pros estados unidos.

de qualquer maneira, se resolver desembarcar no brasil, acho que vem pro gremio. mas acho BRABO que o faça, apesar de toda confiança que sinto de quem tá em porto alegre.
augusto g. disse…
Acho um absurdo que o clube, falido do jeito que está, tenha que fazer um enorme esforço financeiro, movimentando parcerias e todo departamento de marketing para ter um jogador de alto nível que claramente não quer mais jogar futebol.

Se tiver mesmo vontade de voltar, sugiro que ELE aceite o teto salarial do clube e ponto final. É o mínimo de respeito que pode demonstrar.
Vicente Fonseca disse…
Se for mau negócio financeiramente eu também sou contra. É preciso traçar uma estratégia muito cuidadosa. Também por isso é uma aposta. O resultado dentro de campo dirá se ele dará lucro ou prejuízo. Até porque o Grêmio não pode falir duas vezes por causa de um mesmo jogador.
Marcelo disse…
Além de ser contra pelo motivos óbvios, me preocupa o impacto da contratação sobre os outros jogadores. O dentuço teria um salário muito superior aos demais, seria a estrela do time, como era em 2000. Naquela época quando ele jogava bem, o Grêmio ganhava, senão não.
E quanto ao impacto financeiro, se ele quer jogar no Grêmio que joge de graça.

(Ok, depois tento fazer uma análise racional. Até hoje não consegui.)
Vicente Fonseca disse…
Teus argumentos são todos procedentes, Marcelo. É questão de ver prós e contras. Há muita coisa para colocar nesta balança.
Marcelo disse…
Valeu Vicente. Por mais que eu tente, não consigo ver essa situação de maneira "fria".
Se o dentuço realmente voltar, virarei frequentador assiduo da social e vaiarei cada vez que ele tocar na bola. Só paro depois que ele trouxer o bi-mundial.
Vicente Fonseca disse…
dshsdhsdsdh

Te controla, Marcelo!

Odone falando na TV COM. Acho que vai vir mesmo. Ele tá projetando o time como se ele já estivesse contratado.

A ver.
Marcelo disse…
rsrsrrsrs
Pois é, tava assistindo. Inacreditável esta situação. E mais inacreditá ainda é a aprovação de ampla maioria da torcida. Vai entender.
Lourenço disse…
A grande maioria da torcida sempre se posicionou contra, pois era impossível que acontecesse. Agora, que parece provável, todo mundo mudou de lado. E, se assinar com outro time, vão voltar a odiá-lo e dizer que não o querem "nunca mais".

Não estou criticando ninguém, eu sou exatamente o tipo descrito acima.
Vicente Fonseca disse…
Exatamente, Lourenço.

A rejeição a ele existe, mas como joga muito o pessoal tá relevando.
Mário disse…
Se ele vier e jogar bem, todo mundo vai adorar. Simples assim. Douglas veio com pinta de craque, não jogava nada, a torcida vaiava cada vez que tocava na bola. Chegou Renato, Douglas desencantou e agora ele é dos mais aplaudidos quando a escalação é anunciada no estádio. Torcedor é passional, esse comportamento é próprio das paixões - ou vai dizer que alguém aqui nunca se REFESTELOU (COIMBRA, David) com uma garota que outrora chamara de VADIA e mandara à PUTAQUITIPARIU?

Seria um lance de marketing incrível e com grandes chances de sucesso... ou acham que, no Brasil, ele não seria fora-de-série jogando com uma perna só?

É ele vir e o Grêmio sair campeão que fica todo mundo contente. Não há birra que seja maior do que a paixão pelo clube e do que a gana por títulos.

Queremos a Copa, acima de tudo.
Vicente Fonseca disse…
Exatamente, Mário. Por isso defendo que a negociação, por parte do Grêmio, deva levar em conta muito mais a razão que a emoção. É o que parece estar acontecendo.
felipesfranke disse…
Sou contra, técnica e emocionalmente.

1) Ronaldinho há anos não joga e vive no sonho de 'recuperar o tesão', coisa que não acontece e duvido que acontecerá.

2) Acho que o Grêmio não funcionará como funcionou o Corinthians, com um ex-craque que ainda é grande jogador e que joga de vez em quando. - O Grêmio, se quer voltar a vencer a Líber, tem que montar um time que esteja sempre junto.

3) O Grêmio não tem bom histórico com contratações extraordinárias.

4) Ronaldinho é um cara alegre, mas ele cagou pro Grêmio há uma década e não deu NENHUM sinal de ter revisto ou refletido sobre o que significou isso durante seu exílio europeu. Por que teria mudado agora?

5) Aceitá-lo quando outra proposta com a qual Assis belfa é mandá-lo ao futebol dos ESTADOS UNIDOS é, no mínimo, vergonhoso.

Se vier, é óbvio que torcerei e ficarei contente se eel trouzer títulos. Mas isso me parece mais difícil que um time africano ser vice-champ do Mundial Fifa.
LF disse…
me impressiona como, 10 anos depois, ainda há gente que pensa que a família Assis Moreira errou e é a única culpada na história toda, fazendo o Grêmio como vítima.

ainda mais depois do comentário do Sancho, que levanta outra questão de muita relevância: quem garante que ele realmente saiu de graça?

Ora, se hoje uma equipe tem um jogador de Seleção Brasileira no plantel por um ano e meio - e Ronaldinho era de seleção desde julho de 1999 - e essa equipe se recusa a renovar o contrato do atleta, deixando-o a ganhar a metade do que ganhavam jogadores muito menos relevantes, todos nós vamos considerar o clube errado.

Mas com Ronaldinho e o Grêmio a coisa segue sendo diferente. Não é, certo?