Parabéns, tchê!

Minha relação com o Internacional sempre foi permeada por várias certezas e algumas contradições. Não, por nenhum minuto de minha vida cogitei ser colorado, não distorçam aquilo que quero lhes falar.

Nunca escolhi ser gremista, e obviamente não me arrependerei nunca disso. Quando comecei a saber que existia futebol, lá pelos meus seis anos, eu já era tricolor. Meu pai impediria qualquer movimento meu em direção ao lado vermelho. Um ano depois, ganhei minha primeira camisa tricolor, fiquei absolutamente fascinado com a beleza dela (a do Inter achei completamente sem graça, até porque nunca gostei de vermelho) e aí não havia mais volta. Não entendia, do alto de minha inocência, porque eu tinha que torcer contra o Inter, mas o fazia assim mesmo, e peguei gosto pela coisa.

Ao mesmo tempo, sempre tive amigos colorados, parentes colorados, minha mãe é colorada. E aí está mais uma contradição: é óbvio que nunca pensei "que bom que o Inter ganhou, eles estão felizes", porque em futebol adversário é adversário. Rivalidade à parte. A relação pode ser mais complicada do que parece. Apesar do belo sentimento com relação a pessoas próximas a ti, naqueles 90 minutos tu desejas o mal para elas, dentro daquele jogo. Até porque, depois do jogo, essas mesmas pessoas, sabia eu, não teriam qualquer piedade de vir a mim e despejar uma série de gozações. Ok, hoje levo na esportiva todas elas. Mas para uma criança/adolescente é algo absolutamente insuportável.

Até na hora dos parabéns isto é contraditório. Recebi cumprimentos de colorados quando o Grêmio ganhou a Libertadores de 1995, e alguns até pela atuação heroica diante do Ajax, no Mundial. Entretanto, estes mesmos que vieram parabenizar pela atuação em Tóquio, segundos antes vinham com aquele ar insuportavelmente (na época eu tinha 12 anos, era insuportável) vencedor e aquelas palavras que nos fazem sentir de vontade de nos trancarmos em casa em vez de sair para rua. Hoje, eu penso em quantas vezes não fiz o mesmo com vocês, colorados: naquela vitória com o banguzinho em 1995, naquela derrota para o Bragantino em 1996, naqueles 4 a 0 do Juventude em 1999, naquele improvável e maravilhoso Gauchão de 2006, naquela eliminação de 2007 para o Veranópolis, um dos melhores presentes de aniversário que já ganhei. Não sinto pena, claro. Mas é justamente saber da delícia que é tirar sarro da cara do rival que legitimo as gozações passadas - e as futuras que vocês e que nós, gremistas, sempre aplicaremos uns nos outros.

Isso é o que eu entendo como uma rivalidade absolutamente "sadia", como adoram dizer repetidamente por aí. É claro que, lá dentro do estádio, os xingamentos mais baixos são toleráveis. Isso faz parte. Após o jogo à noite provocar aquele vizinho com um "acorda secador!" aos buzinaços é permitido. Mas conviver com o outro de forma civilizada deve ser a lei. Quando se é adolescente, futebol pode ser mais que uma diversão; é a tua supremacia simbólica sobre os colegas da escola. Disso eu não posso me queixar, os anos 90 me foram muito generosos. Futebol é uma diversão, sim. Não pode passar disso para justificar que coisas abomináveis sejam feitas em nome dele.

Como defensor e praticante de uma rivalidade sadia, eu jamais poderia me privar de falar na data de hoje. A data em que o time de vocês, colorados, faz 100 anos de história. Uma história rica, gloriosa, com seus baixos também. Uma história que hoje é centenária. Uma história que, marcada pelas contradições que tenho falado, se confunde um pouco com a minha, já que tenho a sina de dividir com o Sport Club Internacional minha data de aniversário*. E não só nisso: se confunde com a de quase todos os gremistas, como a do Grêmio se confunde com a de vocês. Afinal, os momentos de glória e fracasso de um lado simbolizam o fracasso e a glória do outro, em nossas mentes dominadas pelo azul e pelo vermelho.

Não falo em nome de todos os gremistas, falo em meu nome. Gostaria que pelo menos boa parte da nação tricolor tivesse a grandeza de fazer o mesmo, e ficarei muito feliz a cada manifestação de parabéns que vier de azuis para vermelhos hoje. Porém, quero deixar claro: amanhã tudo volta ao normal. Nos cruzaremos de novo, é o que o destino nos reservou. O primeiro adversário da história de vocês é o primeiro adversário logo após o centenário de vocês. Isso é um motivo de orgulho para mim e para todos nós, tricolores. E claro, se Deus quiser, estragaremos a bonita e merecida festa de vocês.

Aqui, deste gremista, vai um abraço do tamanho do Gigante e do Monumental juntos à nação vermelha pelos 100 anos de história que hoje completa o Internacional. E uma pequena flauta também, pois ninguém é de ferro, né tchê?.

Parabéns, colorados.

* Nascer em 1983, o mais glorioso ano da história tricolor, me reconforta maravilhosamente da coincidência de ter nascido no mesmo dia do Internacional.

Comentários

Lourenço disse…
Parabéns, Vicente!
André Kruse disse…
Muito bom.

Copiei e colei no meu blog.
Lique disse…
bom texto, vicente. pois eu admito, na confusão de ter um pai que não se importava com futebol, que, teoricamente, era colorado, mas no levava comer na mosqueteiro e nos deus uniformes completos do grêmio campeão do mundo, fui "colorado" até os sete anos. quando comecei a tomar posse das minhas faculdades mentais, virei gremista, em homenagem ao meu vô (gremistão e ex-zagueiro do VERANÓPOLIS), a tempo de começar a ir nos jogos em 92, quando o grêmio penava na segundona.

gosto de pensar que minha torcida é fundamental para os bons momentos tricolores, até por que, quando estive ausente, em londres, o grêmio caiu pra segundona. heh. não se preocupem, eu volto pras finais dessa liber! e doce será ser campeão da libertadores no ano do centenário colorado, essa será a maior das manchas.
natusch disse…
Belíssimo texto, o qual assino embaixo, aliás.

E parabéns, nobre professor, presidente e amigo! EXPERSO aqui todo meu respeito, carinho e admiração pelo grande amigo que tenho a sorte de contar entre os mais significativos da minha vida (não podia faltar uma VdeP, né) :D
Vicente Fonseca disse…
Muito obrigado, amigos. Pelos elogios e pelas lembranças.
zeh nascimento disse…
vicente rocks!
lol
Vicente Fonseca disse…
Grande Zeh.

Abraço.

VdP: REABDOG. Nome de time de futebol americano (tipo Oklahoma Rebdogs).
Beth disse…
Filho:
A minha parte eu fiz, mas, apesar da coincidência das datas, não houve jeito de te trazer pro meu time. Paciência...Feliz sou eu que tenho dois grandes motivos pra celebrar o 4 de abril. Bjs.
Vicente Fonseca disse…
Esta é única coisa que eu posso te agradecer por NÃO TER FEITO por mim nestes 26 anos.

:)
Prestes disse…
Parabéns, Vicente! E obrigado pelos teus parabéns à nação colorada!
Marcelo disse…
Parabéns Vicente!
O teu presente (e do Inter também) será entregue amanhã pelo Jonas!
Vicente Fonseca disse…
Se Deus quiser, Marcelo. Seria lindo.

Abraço, valeu!
Lourenço disse…
Será do Fernando Genro.
Vicente Fonseca disse…
Se ele fizesse, me filiaria no PSol. Pra acabar com esses neoLIBBERI (VdP never dies!!!!).
Vine disse…
Parabéns então, desta vez via blog.

Nenhum gremista sequer cogitou enfiar 10 x 0 nesse primeiro grenal de centenários, tal qual o primeiro grenal da história? aueauheuaheuhae

Fiquei sabendo que passou um avião sobre o Beira-Rio durante a festa, com felicitações tricolores. Tiro meu chapéu pra quem fez isto...
Vicente Fonseca disse…
Primeiro aviãozinho do bem, Vine. Diminuir o STRACTI (VdP) bancário pra isso é muita grandeza.

Toquei esta flauta no meu padrinho, colorado dos quatro costados. Ele só deu uma risadinha porque era meu aniversário também, jdfjfdjkfdkjdf.
Pati Benvenuti disse…
Parabéns ao amigo.
Tá bom, parabéns ao Inter também...