O jogaço entre Racing e San Lorenzo foi uma vitória da Copa Argentina



Racing e San Lorenzo viveram uma noite que simbolizou bem mais do que a emoção dos mata-matas. O jogaço entre ambos, dois dos últimos três campeões argentinos, representou a vitória do modelo aparentemente esdrúxulo da Copa Argentina, uma competição eliminatória de jogo único, onde todas as partidas são disputadas em cancha neutra. Tem tudo para dar errado, e na maioria das ocasiões dá mesmo, já que dezenas e dezenas de times pequenos se enfrentam em estádios vazios nas primeiras fases do torneio. Porém, acaba funcionando bem demais quando o enfrentamento ocorre entre duas das maiores torcidas do país.

A sede da partida de ontem foi o Estádio Único Ciudad de La Plata, localizado a cerca de 70 quilômetros de Buenos Aires. O interesse no jogo foi tanto e o engarrafamento em direção ao sul da província foi tão grande que a delegação do Racing perdeu o horário de chegada ao estádio, o que causou atraso no início da partida, marcada para as 20h10, pouco após a hora de pico. Foram mais de 30 mil pessoas à cancha comumente utilizada pelo Estudiantes, numa festa ensurdecedora, e o melhor: com torcida meio a meio. Só este fato já é o suficiente para a "vitória" da Copa Argentina, já que quase todos os clássicos do campeonato nacional já assumiram a derrota de goleada que é a torcida única.
Torcidas de Racing (à esquerda) e San Lorenzo (à direita) dividiram o estádio em La Plata
A partida em si não foi menos espetacular. Mordidos por derrotas para os rivais Independiente e Huracán (em outra deliciosa maluquice platina, que é a rodada de clássicos do campeonato), Racing e San Lorenzo fizeram uma quarta de final com cara de finalíssima. Com poucas chances de ser bicampeão nacional, a Academia foi a campo com o que tem de melhor. Disputando palmo a palmo a liderança do principal certame com o Boca, o time de Edgardo Bauza, por sua vez, poupou Mercier, Yepes, Blanco, Villalba e Romagnoli para a rodada do final de semana. Ainda assim, dono de um dos melhores elencos do futebol argentino, era um time bastante forte.

Com Bou e Óscar Romero inspirados desde o pontapé inicial, o Racing tentou impor um ritmo forte no começo, mas aos poucos foi vendo o esquema de Bauza encaixar melhor, com destaque para os eficientes volantes Kalinski e Ortigoza. Já com o controle do jogo, o San Lorenzo abriu o placar num golaço do uruguaio Cauteruccio. Mas a equipe de Avellaneda mostrou porque é a atual campeã do país: superou o trauma da derrota de 3 a 0 para o Independiente no sábado, se impôs e encurralou o San Lorenzo, que cometeu o grave pecado de se fechar demais no segundo tempo e não ter alternativa no contra-ataque. Aos 31, o excelente volante Luciano Aued, um símbolo do clube azul e branco, empatou o jogo. Comemorou demais o gol não só por ter sido o do empate num momento importantíssimo, mas porque foi o seu primeiro como jogador profissional, aos 28 anos de idade.

Já sem a inspiração de Cauteruccio na frente (mas com Matos, já que o elenco é ótimo), o San Lorenzo seguiu esperando o rival, que estava todo postado para atacar, cheio de substituições ofensivas feitas minutos antes. E o gol da vitória fez justiça a Gustavo Bou, o craque do jogo, mas foi uma crueldade com Mauro Cetto: eficientíssimo durante todo o jogo, o substituto de Yepes, que dera azar ao desviar o chute de Aued no gol de empate do Racing, cometeu o grave erro de agarrar Pavone na área aos 45 da etapa final. Bou converteu o pênalti com categoria compatível à de sua enorme atuação.

O Racing vence, convence e se recupera de um fracasso forte diante do maior rival. O San Lorenzo, por sua vez, sofre o segundo duro golpe em sequência. E o futebol argentino, esse sim, comemora. Foi mais uma noite de ótimo futebol, de muita emoção e, melhor ainda, de estádio dividido entre duas das maiores torcidas do país. Para quem acompanhou a noite de bola em La Plata, a festa protagonizada pelos torcedores dos dois lados ficará na memória por um bom tempo - e pode, por que não?, servir de exemplo para que no campeonato isso se torne possível, ainda que em menor grau.

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