A Seleção tem o dever de jogar mais

Dunga é um cara metódico. As estatísticas são aterradoras e claríssimas: com ele, o Brasil tem 100% de aproveitamento. É incontestável: chega para a Copa América forte, muito melhor do que quando ele assumiu o cargo, com um time despedaçado que estava após o fiasco na Copa do Mundo. O título continental é importante também por isso: recuperar a autoestima da Seleção. E para disputar o torneio no Chile a plenos pulmões, convém não chegar com jogadores desgastados e machucados. Um jogo como o de ontem, no Beira-Rio, com gramado molhado, é propício para lesões.

Tudo isso serve de justificativa para a atuação anêmica do time canarinho no Beira-Rio. Justifica, mas não torna correto o que o Brasil fez ontem. A Seleção, simplesmente, não está em posição de jogar o que jogou diante de Honduras, principalmente porque o jogo foi território nacional. O título da Copa América faz parte do processo de reconstrução da imagem da Seleção após o 7 a 1 e as denúncias de corrupção na CBF/FIFA, mas, tão importante quanto isso, era o torcedor (que raramente vê o Brasil jogar em casa) acompanhar de perto uma boa partida da equipe, o que não ocorreu diante do México, e muito menos contra Honduras.

Quando falo em jogar bem, não digo dar espetáculo. Dar show em amistoso não serve para nada, muitas vezes atrapalha, até. Mas o mínimo que a Seleção deveria apresentar ontem no Beira-Rio era algum interesse. A impressão que se tinha era de que todos os jogadores estavam fazendo um favor em estar ali. É preciso um pouco mais de respeito com quem se aventurou a encarar uma chuva fina e fria (e metade dos assentos ontem no Beira-Rio estavam molhados) e a pagar um ingresso nada barato para ver o Brasil jogar contra a pouco atrativa seleção hondurenha. O mínimo que o time de Dunga precisava demonstrar em campo era ao menos mais vontade de competir.

Dunga disse não ter entendido as vaias após a partida. Pois ou está mentindo ou não está neste mundo. O torcedor gaúcho demorou até demais para vaiar uma Seleção que não não parecia fazer a menor questão de estar tomando sereno no lombo. Os primeiros apupos vieram apenas aos 40 minutos do segundo tempo. A postura de quem foi ao Beira-Rio foi de extrema paciência com uma equipe que, em vez de mostrar aos torcedores brasileiros que está determinada em enterrar o fiasco na Copa, jogou se estivesse no Catar disputando um amistoso suspeito contra as Ilhas Maurício após conquistar um título mundial.

O Brasil ganhou todos os dez jogos com Dunga. Raramente leva algum gol. Tem esquema tático consolidado e que já apresenta um bom entrosamento. Definiu suas vitórias nos amistosos recentes ainda no primeiro tempo. Não correu grandes riscos, não perdeu nenhum craque por lesão, não se desgastou para a estreia com o Peru. Mas tudo isso ainda é pouco, quase nada. O que aconteceu no ano passado deixou uma marca que não vai mais se apagar, principalmente por ter sido em casa, mas pode, quem sabe, ser relevado - desde que a postura seja outra, completamente diferente. Se o momento fosse normal, tudo bem, mas ele não é: ele precede o maior fiasco da Seleção em todos os tempos. É por isso que uma resposta precisa ser dada logo, ainda pelo estilo aguerrido e sério tão ligado ao seu treinador. Se Dunga e seus comandados não entenderem logo que é a Seleção que precisa embalar de novo a torcida, e não o contrário, o ambiente nos jogos em casa nas complicadas eliminatórias será péssimo, venha o título da Copa América ou não.

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