Tudo ótimo, não fosse o campeão

O Grêmio não jogou mal, ao contrário. Dominou o primeiro tempo, saiu em vantagem, não deu chances ao adversário. Sofreu o empate no segundo, mas partiu para cima de novo, teve chances claras de ficar à frente de novo. Mas tomou o segundo, a virada, que complica tudo. Porque do outro lado não estava um time equivalente, como o Internacional, ou bem inferior, como o Criciúma. Estava o campeão brasileiro, que será bi neste domingo. E que, depois de algum tempo oscilante, resolveu jogar como bicampeão nacional na noite desta quinta. É difícil jogar com a corda esticada durante os 90 minutos, e, para vencer este, Cruzeiro só assim.

O filme, parecia, ia se repetir. O Grêmio exibiu todas as suas qualidades que o fizeram aplicar as últimas duas empolgantes goleadas: marcava o rival sob pressão, bem adiantado. Ganhava rebotes, transpirava mais que seu oponente, tinha movimentação intensa dos homens de frente e trocas de posição constantes entre Ramiro, Luan, Barcos e Dudu. Ninguém no Cruzeiro soube, durante toda a etapa inicial, quem era meia, ponta ou centroavante entre esses quatro, tal a qualidade dos movimentos. E tinha, também, chegada de trás dos volantes. Walace fazia um paredão intransponível e dava qualidade à saída de jogo, com ótimos lançamentos. Riveros não tem a capacidade de armar o jogo de Fellipe Bastos, mas chega melhor na área que o colega suspenso. Assim, fez o 1 a 0, já justo, mesmo que fossem só 12 minutos.

Como diante de Inter e Criciúma, o Grêmio não se acomodou com a vantagem. Seguiu em cima do Cruzeiro, e criou algumas boas chances de aumentar o placar. Barcos, de ótimo primeiro tempo, ganhou pelo alto e não fez o segundo pelo detalhe da trave - campeão também tem sorte. Dudu varreu a defesa a dribles e deixou Luan livre, mas o corte da zaga veio na hora certa. Barcos ganhou de Mayke no pé de ferro e deixou Ramiro sozinho, mas Fábio fez milagre. O Cruzeiro até teve um pouco mais de posse ofensiva no fim, como o Inter do primeiro tempo do Gre-Nal. Mas, ao contrário do Colorado, não levou perigo nenhuma vez. Foi só um chute fraco de Júlio Baptista, de fora da área, e nada mais.

Ainda assim, era uma vantagem exígua, 1 a 0 apenas. O Grêmio precisava voltar do intervalo com a mesma gana que voltara no clássico do dia 9 e no Heriberto Hülse. Não conseguiu, por um motivo: quem fez isso foi o Cruzeiro, sabedor de que uma vitória lhe deixaria muito próximo do título. Marcelo Oliveira perdeu, lesionados, Marquinhos e Ceará. Entraram dois titulares, Willian e Mayke. Ou seja, a Raposa estava mais completa do que começou o jogo, com nove jogadores da equipe principal. Ocupou o campo gremista desde o início, envolveu o time gaúcho com seus ataques em velocidade, especialmente pelo lado esquerdo de ataque, e passou a mandar no jogo. Como há dois anos vem sendo praxe, o Cruzeiro passou a atacar com muitos jogadores e se defender com outros tantos, parecendo ter 16 ou 17 atletas, e não apenas 11. É bonito de ver do alto de uma cabine, mas extremamente tenso para quem está numa arquibancada torcendo contra, como os 43 mil gremistas que foram à Arena ontem.

Por isso, Luiz Felipe cometeu um erro decisivo ontem: era evidente que, do jeito que as coisas andavam, o Cruzeiro iria fazer um gol. Era preciso mexer - colocar Alán Ruiz, que valorizaria a bola, era a primeira providência a ser tomada. Ela só viria após a virada. Ricardo Goulart empatou numa jogada "ensaiada" minutos antes, quando ele apareceu por trás da zaga e mandou por cima. Aos 19, sozinho, aproveitou rebote no mesmo lugar e empatou. Só então o Grêmio veio para cima de novo. Barcos não perdeu chance clara aos 25: foi Fábio quem tirou de dentro do gol um arremate correto, potente, do centroavante gremista. O Cruzeiro se fechou calculadamente, esperando um contragolpe diante de um time aberto, que precisava do resultado. A chance veio aos 31, e Éverton Ribeiro não desperdiçou.

O Grêmio encurralou o adversário em vários momentos, teve boas jornadas individuais, mostrou um jogo coletivo excelente nos 45 iniciais e, mesmo com atuação inferior, poderia ter feito o 2 a 1 no segundo tempo. Mas não o fez por um motivo, muito simples, quase simplista, até: o Cruzeiro é melhor. É o melhor time brasileiro em termos de grupo e em qualidade coletiva. Foi dominado durante toda a etapa inicial, quando mostrou o irregular futebol que tem apresentado neste returno. Mas voltou a ser o timaço campeão brasileiro, que se impõe dentro e fora de casa, nos 45 finais. Todo o otimismo gerado antes do jogo advinha do fato de o Grêmio estar em fase técnica superior, em momento mais positivo. Poucos imaginavam que o Cruzeiro jogaria na Arena tudo o que sabe. Foi assim por 45 minutos, e foi já o suficiente para sair com uma vitória espetacular. Em Belo Horizonte, no primeiro turno, cinco minutos de superioridade foram o bastante para aquele 1 a 0 que até hoje dói na alma gremista.

Se em 2013 os 3 a 0 sobre o mesmo Grêmio foi o jogo que simbolizou o título (mesmo que ele só tenha vindo na rodada seguinte, diante do Vitória), a partida de ontem é que garantiu, na prática, o bi da Raposa, contra o mesmo Tricolor Gaúcho. O resultado é espetacular não apenas porque foi conquistado na Arena lotada, diante de um dos principais times do campeonato, mas porque deixa os comandados de Marcelo Oliveira a uma vitória do bicampeonato. Ele provavelmente virá domingo, no Mineirão lotado, diante de um Goiás que pouco tem a fazer na competição. A festa dos jogadores e torcedores mineiros ontem no Humaitá já dava o tom de que a conquista está praticamente sacramentada.

Quanto ao Grêmio, o resultado é péssimo, mas ainda não definitivo. Para chegar em vantagem para as últimas duas rodadas, só um resultado interessa em São Paulo: a vitória sobre o Corinthians em sua arena, tarefa nada fácil de ser cumprida. Caso empate, o Tricolor fica na dependência de tropeços de Timão e Inter nas próximas rodadas, sem direito a vacilos contra Bahia e Flamengo. A vaga já era difícil com vitória ontem, já que a exigência é alta. Agora, complicou ainda mais, embora não seja ainda nada impossível. O fato é que qualquer vantagem, por mínima que seja, vale ouro numa briga tão parelha. E o Grêmio a deixou escapar ontem, dentro de casa.

Um a menos
Com a vexatória derrota de 4 a 1 para a Chapecoense, o Fluminense dá praticamente adeus à disputa por uma vaga na Libertadores. Com 57 pontos, só chegará ao torneio continental por milagre. Na prática, um concorrente a menos para a Dupla Gre-Nal, mas nisso também há um lado ruim: talvez o time de Cristóvão Borges (que permanece, apesar do fiasco) jogue contra o Corinthians, no dia 30, desmobilizado.

Embolou tudo
O espetacular resultado da Chape embolou de vez a briga contra o rebaixamento, e foi péssimo para todo mundo lá atrás. A equipe catarinense foi a 39, pulando para o 15º lugar. Agora, o Palmeiras, 14º, está só um ponto à frente da zona de rebaixamento, que volta a ter o Coritiba, com 38. O duelo entre Coxa e Palmeiras neste domingo é absolutamente decisivo. E o time de Chapecó, ganhando do Botafogo, rebaixa os cariocas no domingo e escapa definitivamente da queda.

Ficou para Núñez
O fato de ocorrer ao mesmo de tempo de Grêmio x Cruzeiro me tirou qualquer chance de acompanhar o clássico argentino. O 0 a 0 entre Boca e River na Bombonera, porém, não garante nada: só transfere a decisão para quinta que vem, no Monumental de Núñez. Imperdível!

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