4 anos em 90 minutos
A Copa do Mundo é recheada de fantásticas histórias de revanches. Muitos tiveram ao longo desses 84 anos de história a possibilidade de uma segunda chance, mas poucos souberam aproveitá-la tão espetacularmente quanto a Holanda, hoje, diante da Espanha. A Fonte Nova viu um capítulo glorioso, dos mais marcantes do futebol mundial em todos os tempos. Agora, imaginem só se o jogo de abertura da Copa tivesse sido esse, como era até 2002, quando o campeão anterior abria a competição?
O título deste texto fala em 90 minutos por uma questão poética, mas na verdade a partida de Salvador se decidiu em 45 minutos, os 45 finais. No primeiro tempo, houve equilíbrio, para não dizer domínio espanhol. Mas nada de tiki-taka, de posse de bola obsessiva: o time de Del Bosque só teve trocas rápidas de passes em determinados momentos pontuais da partida. E não foi por conta da boa marcação do 3-5-2 holandês: foi uma determinação do próprio técnico espanhol ter uma posse mais objetiva nesta Copa. Pouco habituada a isso, a Fúria aproveitou menos do que poderia a qualidade de seus meias e abusou de lançamentos desde a sua defesa, procurando o referente Diego Costa à frente. A tarde já começava estranha por aí.
O gol espanhol veio num pênalti no mínimo bem duvidoso (a meu ver, inexistente, em mais um erro capital de arbitragem na Copa), mas a partir do antigo estilo desta equipe: um passe perfeito, rasteiro, infiltrado de Xavi por trás da zaga para o brasileiro naturalizado. O gol simbolizava a melhor partida espanhola, mas a Holanda não jogava mal. Marcava com firmeza e saía com grande rapidez nos contragolpes - antes do gol de Xabi Alonso, Sneijder perdeu cara a cara com Casillas. Uma triste reprise de 2010, quando Robben perdeu duas vezes tendo pela frente só o goleiro espanhol. Um drama que durou 4 anos e 43 minutos.
O gol de Van Persie mudou tudo. Primeiro, porque foi espetacular: um cruzamento quase do meio-campo de Blind que procurou a projeção do centroavante, que encobriu Casillas com uma cabeçada mágica. Segundo, claro, porque empatou a partida num momento-chave, o final do primeiro tempo. Terceiro, porque tirou de Casillas a possibilidade de quebrar o histórico recorde de Walter Zenga, que com 517 minutos ainda é o goleiro que ficou mais tempo sem sofrer gol em Copas. E quarto, porque escancarou o caminho para a Holanda chegar à vitória: lançamentos longos pegando a defesa espanhola em linha.
O segundo tempo, sim, foi um massacre histórico, com três gols (o 2º, o 4º e o 5º) surgindo justamente na base da velocidade contra a lentidão. E a diferença foi mesma essa: quatro gols. Isso que Sneijder nem jogou tudo o que sabe. Mas Robben foi histórico: jogador mais engasgado com a derrota de Joanesburgo, parece ter se preparado quatro anos só para este jogo. Marcou dois golaços, fez a jogada de outro, obrigou Casillas a um milagre após um sem pulo espetacular e enloqueceu Piqué e Sergio Ramos, com dribles verticais e uma velocidade estonteante. Van Persie não ficou atrás: oportunista, levou a zaga ibérica ao pânico a tarde toda. Foi outro que fez dois gols.
A Espanha não sabia o que fazer. Entraram Torres e Fabregas (a Fúria esbanja elenco) e nada mudaram o rumo da partida. Xavi sumiu, Iniesta jogou pouco a tarde toda. Em vez de trocas envolventes, muitos passes errados. Em vez de marcação adiantada e agressiva, um time que deixava a Holanda sair com a bola dominada e simplesmente não conseguia marcá-la. E todo mundo estava em campo. 11 dos 14 jogadores que atuaram hoje jogaram aquela partida no Soccer City. Pela Holanda, só quatro: os três da frente e De Jong. Quem diria que o 3-5-2 de Van Gaal daria esse show? E não foi coisa de 10 ou 15 minutos de domínio: os gols no segundo tempo foram bem espaçados, quase que 10 em 10 minutos, como um relógio, furioso e laranja.
Resta saber como a Espanha reagirá a este fiasco. A equipe segue sendo uma das favoritas da Copa pelo grupo que tem, mas como jogará diante do Chile? Mordida ou abalada? Em depressão ou determinada a virar este jogo? A classificação, aliás, já está seriamente ameaçada. Se os chilenos ganharem hoje da Austrália, só a vitória interessa aos espanhóis diante dos sul-americanos, principalmente porque o saldo de gols está totalmente comprometido. A Holanda, por sua vez, além de encaminhar a classificação, dá um passo gigante para evitar o anfitrião Brasil logo nas oitavas. Se bem que, pelo que jogou hoje, quem tem de temê-la são os adversários, e não o contrário.
Ficha técnica
Copa do Mundo 2014 - Grupo B - 1ª rodada
13/junho/2014
ESPANHA 1 x HOLANDA 5
Local: Fonte Nova, Salvador (BRA)
Árbitro: Nicola Rizzoli (ITA)
Público: 48.173
Gols: Xabi Alonso (pênalti) 26 e Van Persie 43 do 1º; Robben 7, De Vrij 18, Van Persie 26 e Robben 34 do 2º
Cartão amarelo: Casillas, De Vrij, De Guzman e Van Persie
ESPANHA: Casillas (4), Azpilicueta (5), Sérgio Ramos (4) Piqué (3,5) e Alba (4,5); Busquets (4,5), Xabi Alonso (4,5) (Pedro, 17 do 2º - 4,5) e Xavi (5); Silva (4,5) (Fabregas, 17 do 2º - 4), Diego Costa (4,5) (Torres, 17 do 2º - 4,5) e Iniesta (5). Técnico: Vicente del Bosque
HOLANDA: Cillessen (6,5) Vlaar (7), De Vrij (6,5) (Veltman, 31 do 2º - 5,5) e Indi (6); Janmaat (6,5), De Jong (5,5), Guzman (6) (Wijnaldum, 16 do 2º - 5,5), Sneijder (6) e Blind (7,5); Robben (9,5) e Van Persie (8,5) (Lens, 33 do 2º - sem nota). Técnico: Louis van Gaal
O título deste texto fala em 90 minutos por uma questão poética, mas na verdade a partida de Salvador se decidiu em 45 minutos, os 45 finais. No primeiro tempo, houve equilíbrio, para não dizer domínio espanhol. Mas nada de tiki-taka, de posse de bola obsessiva: o time de Del Bosque só teve trocas rápidas de passes em determinados momentos pontuais da partida. E não foi por conta da boa marcação do 3-5-2 holandês: foi uma determinação do próprio técnico espanhol ter uma posse mais objetiva nesta Copa. Pouco habituada a isso, a Fúria aproveitou menos do que poderia a qualidade de seus meias e abusou de lançamentos desde a sua defesa, procurando o referente Diego Costa à frente. A tarde já começava estranha por aí.
O gol espanhol veio num pênalti no mínimo bem duvidoso (a meu ver, inexistente, em mais um erro capital de arbitragem na Copa), mas a partir do antigo estilo desta equipe: um passe perfeito, rasteiro, infiltrado de Xavi por trás da zaga para o brasileiro naturalizado. O gol simbolizava a melhor partida espanhola, mas a Holanda não jogava mal. Marcava com firmeza e saía com grande rapidez nos contragolpes - antes do gol de Xabi Alonso, Sneijder perdeu cara a cara com Casillas. Uma triste reprise de 2010, quando Robben perdeu duas vezes tendo pela frente só o goleiro espanhol. Um drama que durou 4 anos e 43 minutos.
O gol de Van Persie mudou tudo. Primeiro, porque foi espetacular: um cruzamento quase do meio-campo de Blind que procurou a projeção do centroavante, que encobriu Casillas com uma cabeçada mágica. Segundo, claro, porque empatou a partida num momento-chave, o final do primeiro tempo. Terceiro, porque tirou de Casillas a possibilidade de quebrar o histórico recorde de Walter Zenga, que com 517 minutos ainda é o goleiro que ficou mais tempo sem sofrer gol em Copas. E quarto, porque escancarou o caminho para a Holanda chegar à vitória: lançamentos longos pegando a defesa espanhola em linha.
O segundo tempo, sim, foi um massacre histórico, com três gols (o 2º, o 4º e o 5º) surgindo justamente na base da velocidade contra a lentidão. E a diferença foi mesma essa: quatro gols. Isso que Sneijder nem jogou tudo o que sabe. Mas Robben foi histórico: jogador mais engasgado com a derrota de Joanesburgo, parece ter se preparado quatro anos só para este jogo. Marcou dois golaços, fez a jogada de outro, obrigou Casillas a um milagre após um sem pulo espetacular e enloqueceu Piqué e Sergio Ramos, com dribles verticais e uma velocidade estonteante. Van Persie não ficou atrás: oportunista, levou a zaga ibérica ao pânico a tarde toda. Foi outro que fez dois gols.
A Espanha não sabia o que fazer. Entraram Torres e Fabregas (a Fúria esbanja elenco) e nada mudaram o rumo da partida. Xavi sumiu, Iniesta jogou pouco a tarde toda. Em vez de trocas envolventes, muitos passes errados. Em vez de marcação adiantada e agressiva, um time que deixava a Holanda sair com a bola dominada e simplesmente não conseguia marcá-la. E todo mundo estava em campo. 11 dos 14 jogadores que atuaram hoje jogaram aquela partida no Soccer City. Pela Holanda, só quatro: os três da frente e De Jong. Quem diria que o 3-5-2 de Van Gaal daria esse show? E não foi coisa de 10 ou 15 minutos de domínio: os gols no segundo tempo foram bem espaçados, quase que 10 em 10 minutos, como um relógio, furioso e laranja.
Resta saber como a Espanha reagirá a este fiasco. A equipe segue sendo uma das favoritas da Copa pelo grupo que tem, mas como jogará diante do Chile? Mordida ou abalada? Em depressão ou determinada a virar este jogo? A classificação, aliás, já está seriamente ameaçada. Se os chilenos ganharem hoje da Austrália, só a vitória interessa aos espanhóis diante dos sul-americanos, principalmente porque o saldo de gols está totalmente comprometido. A Holanda, por sua vez, além de encaminhar a classificação, dá um passo gigante para evitar o anfitrião Brasil logo nas oitavas. Se bem que, pelo que jogou hoje, quem tem de temê-la são os adversários, e não o contrário.
Ficha técnica
Copa do Mundo 2014 - Grupo B - 1ª rodada
13/junho/2014
ESPANHA 1 x HOLANDA 5
Local: Fonte Nova, Salvador (BRA)
Árbitro: Nicola Rizzoli (ITA)
Público: 48.173
Gols: Xabi Alonso (pênalti) 26 e Van Persie 43 do 1º; Robben 7, De Vrij 18, Van Persie 26 e Robben 34 do 2º
Cartão amarelo: Casillas, De Vrij, De Guzman e Van Persie
ESPANHA: Casillas (4), Azpilicueta (5), Sérgio Ramos (4) Piqué (3,5) e Alba (4,5); Busquets (4,5), Xabi Alonso (4,5) (Pedro, 17 do 2º - 4,5) e Xavi (5); Silva (4,5) (Fabregas, 17 do 2º - 4), Diego Costa (4,5) (Torres, 17 do 2º - 4,5) e Iniesta (5). Técnico: Vicente del Bosque
HOLANDA: Cillessen (6,5) Vlaar (7), De Vrij (6,5) (Veltman, 31 do 2º - 5,5) e Indi (6); Janmaat (6,5), De Jong (5,5), Guzman (6) (Wijnaldum, 16 do 2º - 5,5), Sneijder (6) e Blind (7,5); Robben (9,5) e Van Persie (8,5) (Lens, 33 do 2º - sem nota). Técnico: Louis van Gaal
Comentários
Aliás, convenhamos: estamos no segundo dia, mas QUE Copa até agora. O pior jogo foi México x Camarões, que ainda assim foi bem movimentado. Estamos no intervalo da quarta partida e já foram marcados 14 gols. Chile x Austrália está muito interessante também.
Foi feita história.
Robben pode ser um canelinha de vidro, pipoqueiro por vezes e ter jogadas conhecidas por todos;porém, JOGA MUITO!
Van Persie e Robben humilharam a defesa espanhola.
O histórico Blind também fez uma partida fantástica com lançamentos prescisos.
A Fúria deu espaços e está com um ataque fraco.
Não gostei da escalação da Real Seleção Espanhola, o meio campo não está marcando bem e falta objetividade ao ataque.
Por que Villa é reserva?