Tocam as cornetas do Apocalipse
Nos instantes posteriores à indigesta derrota do Grêmio para o Juventude, 3 a 2 no Alfredo Jaconi, a vontade não era exatamente de escrever uma análise da partida, e sim de despejar adjetivos em cima da equipe gremista. Afinal de contas, deixou o Juventude virar o jogo no finalzinho, o time caxiense com um atleta a menos, em uma partida na qual o gosto da auto-sabotagem armagou como fel na garganta tricolor. Mas aí a gente pensa que o Grêmio ainda é lider na classificação geral do Gauchão, que ganhamos o primeiro turno, que a prioridade maior é sempre a Libertadores, e resolve dar tempo de chegar em casa do trabalho para que as ideias se assentem e a razão retorne. Pois bem, a gente chega em casa, a racionalidade retoma o cérebro e olha, a verdade é que a indignação continua lá, imaculada. Ou seja, pro diabo com a razão, vamos deixar a indignação falar desta vez, que é isso que o momento merece mesmo.
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Primeiro de tudo: Renato Portaluppi, toma vergonha nessa tua cara. OK, ir jogar futevôlei não é nada tão horrível assim, vai perder um ou dois recreativos e nada mais, o prejuízo final é pequeno e por aí vai. Eu engoliria alegremente todas essas explicações, se nosso treinador fosse brincar nas areias cariocas deixando para trás um time ajeitadinho, com as peças no lugar. Pelo contrário: o Grêmio é cada vez mais uma maçaroca, uma gosma nojenta, uma maionese desandada que só serve para sujar de gordura a pia da cozinha. A defesa faz água, os laterais brincam de pique ao invés de apoiar, os volantes não se entendem, a armação só arma ciladas e o ataque perde gols como se esse, e não marcá-los, fosse o objetivo da brincadeira. Até o goleiro, antes intransponível, anda falhando sistematicamente. Do mesmo modo que o Grêmio encheu os olhos pelo padrão de jogo no final de 2010, agora enche a paciência de todos com a quantidade de defeitos que apresenta. Um treinador responsável pode até cogitar bater uma bolinha no Rio de Janeiro durante o período de trabalho - mas deveria, em nome das centenas de milhares de reais que ganha por mês, cancelar a viagem imediatamente assim que testemunhasse o que foi possível ver no Jaconi nesta quarta-feira. Nada menos que isso.
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Gílson, sejamos justos, fez uma linda bucha de cabeça, daquelas de entrar para a lista dos gols mais bonitos da rodada. Pena que foi contra. E não se apele para a hipocrisia de dizer que o lateral esquerdo será perseguido por isso - o fato é que o atleta não tem nível para fardar a tricolor e jogou o que geralmente tem jogado, ou seja, pouco mais que nada. Não é culpa dele, frisemos - é culpa de quem o trouxe e especialmente de quem insiste, de forma autista, em escalá-lo de novo e de novo. Do outro lado, Gabriel é cada vez menos do que pode ser, o que também não é nada animador. Fernando deixou o futebol nas seleções de base, enquanto Douglas parece cada vez mais convicto de que jogar bem é algo que ele só precisa fazer quando dá na telha, e não quando o time necessita. No ataque, Leandro foi bem uma vez mais, mas deixou-se contagiar pela indolência generalizada ao perder um gol feito, assim como Borges. E lá vamos nós para o penúltimo parágrafo, onde toco exatamente nesse ponto lamentável da cada vez mais lamentável equipe gremista.
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Muito pior do que tudo isso - do que os fracassos individuais, do que a falta de visão do comandante, do que a teimosia estúpida e do que as deficiências escancaradas - é a absoluta acomodação diante do quadro que se desenha sem disfarces desde o começo da temporada. Porque aqui entre nós, QUEM poderá alegar surpresa quando o Grêmio for eliminado nas oitavas da Libertadores, vitimado por algum Caracas ou Godoy Cruz da vida? Nem a Velhinha de Taubaté, caso gremista, seria capaz de semelhante ingenuidade. O Grêmio repete-se pateticamente nos mesmos erros, jogo após jogo - e nao só os atletas parecem achar que é tudo questão de tempo e que logo o time se ajeita como num abre-te-sésamo, como o treinador parece tomado do mesmo delírio lisérgico de que as coisas não estão tão ruins assim. Estão ruins, sim senhor. E ainda tenho que ler jogador no Twitter falando que o Grêmio é Imortal - o que leva a gente para o derradeiro parágrafo.
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Imortalidade o diabo. Peguem a imortalidade, tão falada e tão pouco exercida, e acondicionem sem muitos pudores bem lá onde vocês estão pensando. Não quero ganhar vaga na Libertadores no sufoco, não quero virar partidas dramáticas contra um timeco de quinta categoria, não estou preocupado em saber se fulano dá carrinho a cada quinze segundos ou se o treinador tem um enfarto do miocárdio de tanto gritar na beira do gramado. Como torcedor e apreciador do futebol, quero apenas e tão-somente isso: FUTEBOL. Nada de heroismos galopantes: quero toque de bola, trocas de passe, articulações ofensivas, movimentaçao coordenada entre laterais, bom posicionamento da zaga e precisão no ataque. A torcida que cante o sobrenatural tricolor em prosa e verso - de dirigentes, comissão técnica e jogadores, quero soluções concretas, dentro do campo e no mundo real. Pena, de verdade, que elas parecem cada vez menos críveis. E que, pelo andar da carruagem, vou ter que engolir mais um ano perdido nessa maldita década que, já entrando nos onze anos, insiste em não acabar.
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Foto: Wesley Santos / Pressdigital / Terra
Comentários
Isso só prova que os melhores textos são aqueles escritos com o FÍGADO. Como é bom ver gente com teu gabarito escrever tão bem aquilo que penso.
BASTA!
Chega de ano após ano fracassarmos! É preferível o barulho incessante da corneta do que o cegueira voluntário do alento (abraço, Dilma).
Queria saber se algum de nós aqui, que toca uma labuta diária em troca de alguns caraminguás no fim do mês - cujo sonho é sair nu pelas ruas e não ser preso, mas a realidade só permite almoçar no RU justamente quando a sobremesa é MAÇÃ - poderia deixar o seu trabalho em pleno fim do mês para participar de um campeonato de futevôlei. Nossos empregos e ânus não seria perdoados.
A torcida parece hipnotizada. O alento como forma de torcida é válido. Agora, como forma de se ver futebol está corroendo o Grêmio.
O Tricolor parece aquele cara que, quando tem a oportunidade de comprar uma casa própria, resolve ficar vivendo de aluguel para mostrar como o "mundo é injusto" e o "capitalismo maltrata o homem". Parece um eterno adolescente birrento e sonhador que insiste em não crescer.
Há anos que meu pai - maior conhecedor de futebol que conheço - diz que o Grêmio abdicou de propor um estilo de jogo. Não há aproximações, triangulações e aquele marcação renhida, sem espaços. É tudo na base de parir uma bigorna, escrever livro e fazer DVD.
Digo-lhes uma coisa, senhoras e senhores: quando éramos treinador por Celso Juarez Roth nossa defesa não era uma mãe solteira e desamparada. Aceitem isso.
CHEGA DE IMORTALIDADE SEM AIR-BAG!
EU QUERO FUTEBOL!
qual é o problema de fazer 3-1 e ficar tocando a bola tranquilamente?
CHEGA DE IMORTALIDADE SEM AIRBAG!
não tenho saúde pra isso.
Meus temores no começo da temporada estão se confirmando. Infelizmente...
Não acho que tenha sido uma partida tão ruim, mas concordo com o Vicente que aqui nos comentários disse que o problema é não haver evolução desde o início do ano.
Acho, somente acho, que o Leandro poderá arrumar o time do meio pra frente. Finalmente alguém com velocidade, que dribla, vai pra cima, e pra quem o Douglas vai poder dar aqueles passes pelo meio da zaga.
Aquele chute de futebol americano do Borges na frente do gol foi de uma displicência que deveria redundar em demissão por justa causa: não ajeitou o corpo, não dominou, não colocou, nada.
De resto, digo algo que precisa ser dito (apesar de algumas discordâncias): Willian Magrão não dá. Não tem velocidade, não tem fôlego, desaparece em campo. Um ex-jogador com 20 e poucos anos. Quando que ele aparece no jogo? Vocês veem ele roubar bolas? Armar jogadas? Fazer um grande lançamento? Ele é volante! E não faz nada disso. Não tem muito a ver com o jogo de ontem (ele tinha saído antes dos 2 gols do Juventude), mas continuo com essa ideia.
vcs estão cada vez mais geniais.