Mais um capítulo da chatice
O futebol brasileiro inventou uma nova moda de uns anos para cá, uma das mais chatas de que se tem notícia desde Charles Miller: a comemoração de títulos homologados pelas entidades que comandam o futebol. Virou doença: basta um time ter vencido um torneiozinho há cinco ou seis décadas atrás envolvendo equipes de dois ou três países europeus que lá vai a cartolagem busca junto à FIFA o selo "campeão mundial". Primeiro foi o Vasco, com o tal Sul-Americano de 1948; a seguir, o Palmeiras com seu Mundial pré-histórico; depois, a enxurrada de novos campeões nacionais; e assim foi indo, até que chegássemos ao capítulo de ontem, que promete encerrar, mas vai apenas prolongar, uma das mais polêmicas discussões do nosso futebol.
O reconhecimento do título de 1987 do Flamengo é algo que a CBF podia ter realizado há muito mais tempo. É simples: Flamengo e Sport como campeões brasileiros daquele ano. Por que não? A Copa União, reunindo os 16 grandes do país, teve seus participantes definidos de forma arbitrária, mas era de fato o Brasileirão da época. Isso não desmerece o título do Sport, que foi tão ou ainda mais legítimo por estar de acordo com o regulamento da época. Claro, o ideal é que houvesse o cruzamento entre Flamengo, Inter, Sport e Guarani. Não havendo, para acabar com a discussão, declara-se ambos como campeões. Uma incomodação a menos. Não entendo porque se levou tanto tempo para chegar a esta conclusão simplificadora, talvez até simplista, reconheço.
Infelizmente, porém, trata-se apenas de mais um capítulo deste imbróglio todo. Afinal, com este título, o Flamengo não teria direito à taça das bolinhas? Mas e o Santos, pentacampeão da Taça Brasil (e portanto brasileiro, de acordo com as bizarrices da CBF)? Não seria o primeiro pentacampeão brasileiro? E a Copa do Brasil? Se a Copa União nem reconhecida pela CBF era, não seria o caso de conceder status de campeões nacionais aos detentores da Copa do Brasil? E a Copa dos Campeões Regionais, de 2000 a 2002, onde entra?
Tudo muito chato. O Flamengo não precisa do selinho da CBF na taça de 1987 para incluir aquela conquista em sua galeria nobre de troféus. Os carimbos FIFA, CBF ou seja lá que federação, servem para duas coisas: que dirigentes incompetentes na hora de formar times virem ídolos via tapetão e para tornar o futebol muito mais chato. Alguém, além da Patrícia Amorim, estourou espumantes ontem? Em 13 de dezembro de 1987, mesmo sem a marquinha da CBF, garanto que sim.
Em tempo:
- Sugestão: que a taça das bolinhas não vá para clube algum e siga circulando a cada ano, de acordo com o novo campeão nacional. É muito mais simpática que qualquer outro troféu.
Comentários
Desculpe, professor, sei q este é um espaço nobre da crônica esportiva, e os palavrões não fazem jus, porém o assunto é demasiadamente chato!
Na verdade, com a onda de novos reconhecimentos (que, segundo Teixeira, é o que embasou a decisão da CBF de reconhecer a Copa União), a Taça poderia ficar com o Santos (considerando tudo) ou com o SPFC (com os títulos "oficiais"). A decisão pelo Flamengo não atende a nenhum critério.
Hoje, por exemplo, entendo que os argumentos de Gustavo Poli e de Os Campeões do Brasil sobre o assunto são os mais sólidos. Ambos vão de encontro ao reconhecimento da Copa União como torneio passível de estabelecer um "campeão brasileiro".
Do que sei, o grande problema é que 1987 é único; há dois anos em que pode traçar paralelos, 1993 e 2000, mas não foram exatamente a mesma coisa. Então, não existe nenhum parâmetro para auxiliar na compreensão do que efetivamente aconteceu naquele ano.
A "Copa União" foi vivida como campeonato brasileiro; e isso bastaria. Porém, houve outra competição, não com a mesma pretensão, mas com a noção de que fazia parte do campeonato brasileiro. A CBF saiu-se pela idéia de que os torneios eram paralelos, logo, houve dois campeões. Não eram! Isso é uma visão típica de quem está na posição da Copa União. Não havia dois torneios paralelos. Existia um que se entendia paralelo, e outro que se imaginava parte de um maior, englobando aquele um.
Houve uma tentativa de acomodação, de o estabelcimento de um compromisso, com a realização das finais pretendida pela CBF e os clubes que disputavam a "Roberto Gomes Pedrosa", mas os grandes clubes se recusaram. A Copa União bastaria em si mesma. Como as finais foram disputadas apenas pelos clubes do Módulo Amarelo (diferentemente de 1993 e 2000, em que foram disputadas normalmente por todos os classificados), a questão do campeão brasileiro ficou no ar.
Sobre esse assunto, o antigo CND se manifestou. O Judiciário se manifestou. Agora, a CBF também se manifestou (mas sem esclarecer baseado em quê). E foram três respostas diferentes! Para o CND, o campeão era o Flamengo; para o Judiciário, o Sport; e, para a CBF, ambos.
Sinceramente, o fato de a “Revolução” não ter sido completa, já que a Liga de Clubes não se confirmou e o C13 voltou a disputar torneios da CBF, e um verdadeiro compromisso foi consolidado somente em 1989, acho que a Copa União não consegue se estabelecer totalmente como um Campeonato Brasileiro. Mas isso sou eu.
Abraço.
P.S.: O paralelo de 2000 é explorado pelo Poli e por "Os Campeões do Brasil", não tenho o que acrescentar. Mas o paralelo com 1993 é impressionante, e me espanta não ter sido exposto:
I. O campeonato foi disputado por 32 clubes (como em 1987!), divididos em dois módulos de 16 (como em 1987!), cada módulo com dois grupos de 8 (como em 1987!).
II. Não houve nome para os módulos, mas nas chaves A e B ficaram os clubes do C13 (como em 1987, inclusive o Grêmio!), mais Bragantino, Sport e Guarani (pela campanha em 1992, mas que ironia!); nas C e D, o resto (como em 1987!).
III. Rebaixamento, só nas chaves C e D (como em 1987!), caindo 8 clubes (como em 1987!).
IV. No ano seguinte, a Primeira Divisão teve 24 clubes (como em 1988!).
Isso tudo apenas 6 anos depois! Impressionante...
O texto do Gustavo Poli está aqui; e o de "Os Campeões do Brasil" está aqui, na Seção "Perguntas Freqüentes" (questão 7).
Boa explanação, Sancho. E é incrível mesmo a sequência de coincidências 1987-1993. Nunca tinha parado para pensar. Talvez a diferença é que, em 1993, os clubes grandes admitiam os 16 pequenos como participantes do campeonato, ao contrário de 1987.
vou propor um jogo, tipo quebra cabeça: vc junta flamengo/ PATY amorim, CBF/ ricardo teixeira, corinthians/ andrés sanchez, direitos de transmissão, globo e record e vê o que vai dar.
O SISTEMA É FODA, PARCEIRO.
VdP: FESES.
eu li todos esses nomes numa 'reportagem' do yahoo, fui correndo ver se a minha carteira estava em casa.
Intriga da oposição, Zezinho. Naquela época minha predileção era por Pato Donald, Tom & Jerry e Thundercats. Futebol, só de 1990 para cá :)
Muito interessante acerca das negociatas nos bastidores.
Não tenho o que argumentar ou falar mais, visto a qualidade do que já foi exposto. Apenas uma curiosidade: o Brasileiro de 1988 foi chamado de 'Segunda Copa União'.
Enquanto isso, espero que a FGF homologue o Metropolitano de 1937, a Copa Emídio Perondi e a Copa RS de 2005 como Campeonatos Gaúchos ao Nóia.
Chupa, 15!
Acho que o paralelo com a copa joao havelange é mais adequado.
Um aspecto que nunca se aborda sobre a copa união de 1987 é a questão dos cruzamentos dentro do Modulo verde. O Atlético-MG venceu os dois turnos e o Flamengo foi como vice do segundo turno. (e existiria um outro regulamento que previa outra coisa - http://img691.imageshack.us/i/dvidasobreregulamento2.jpg/ )
E essa aí é nova pra mim, André. Quem seria o classificado de acordo com este outro regulamento? O Flamengo ficaria de fora?
Certa vez o Ubiratan Leal (depois de ter sido muito grosseiro) disse que se tratava de uma especie de força-barra do Palmeiras
O texto alertava para a inutilidade da segunda colocação do Grêmio no Primeiro Turno, dois pontos atrás do Atlético, primeiro colocado. Além do fato de ter terminado com melhor pontuação que o Inter, mas como eram de grupos diferentes (os jogos eram contra clubes de grupos diferentes), o Grêmio foi "prejudicado" - com menos pontos, o Inter se classificou, pois foi o campeão de seu grupo.
Como o Atlético venceu o returno, ganhou um ponto-extra para as semi-finais. Ou seja: jogava por "placares iguais" contra o Flamengo. E se vencesse o primeiro jogo, transformaria o segundo em amistoso - vi algo semelhante na Copa Emídio Perondi de 2005.
Uma zona completa. Sempre achei uma burrice essa de grupo A x grupo B.
Mas um fato curioso: o Mestre João Saldanha, em sua coluna, comparava o Clube dos 13 ao...PMDB.
Melhor comparação