Minha casa, sua casa
Quarta-feira, 6 de outubro de 2010. O Campeonato Brasileiro entra em sua reta final. Após esta rodada, a 28ª, faltarão apenas dez para sabermos quem será o 40º campeão nacional, os quatro representantes do país na Libertadores do ano que vem, os oito que disputarão a Copa Sul-Americana e os quatro rebaixados. Entre as partidas decisivas, o líder Fluminense recebe o Santos, no Engenhão; o São Paulo, que sonha com G-4, enfrenta o Vitória, em Barueri; o desesperado Atlético/MG precisa vencer o Corinthians em Sete Lagoas; num confronto de rebaixáveis, Flamengo e Atlético/GO darão a vida em Volta Redonda; e o Palmeiras, que vive boa fase, recebe o ameaçado Avaí, no Pacaembu.
Quem lê com atenção este primeiro parágrafo, percebe que há algo errado. Se ainda não viu, explico: a 28ª rodada foi o exemplo mais claro de uma característica marcante, mas negativa deste Brasileirão: cinco partidas, ou metade da rodada, foram disputadas em estádios que não são as casas habituais das equipes. Não chegam a ser campos neutros: o Palmeiras se dividiu entre Pacaembu e Arena Barueri ao longo de todo o campeonato. Excluindo clássicos, foram 16 partidas longe do Palestra Itália, mas perto de sua torcida. O Santos, por opção, jogou três vezes no Pacaembu. Mas não são as casas que estamos, há décadas, acostumados a ver.
Ao todo, de 380 jogos (já projetando as duas últimas rodadas), 67 foram ou ainda serão disputados em estádios estranhos aos habituais. Desconto deste cálculo todos os clássicos, inclusive os disputados na Arena do Jacaré pelos clubes mineiros e os cariocas que não incluem o Botafogo no Engenhão. O número, dependendo do ponto de vista de quem faz o levantamento, poderia ser ainda maior, portanto. Isso representa 17,6% das partidas. Número que deve crescer em 2011 e 2012. Sete dos 20 clubes passaram por isso, mais de um terço dos participantes.
Os mais prejudicados, sem dúvida, foram os clubes mineiros. Seria simplista e mentiroso apontar a ausência do Mineirão como o fator que explica a má campanha do Atlético/MG ou o provável não-título do Cruzeiro, mas jogar em Sete Lagoas, Uberlândia e Ipatinga, no mínimo, lhes tirou um bom dinheiro. Donos de médias invejáveis de público nos últimos anos, os times de Belo Horizonte penaram em 2010. Em 2009, o Atlético/MG ostentou uma média de 42 mil torcedores por jogo no Mineirão; em 2010, este número caiu para 13 mil, quase 70% menor. O Cruzeiro, que tem oscilado entre 30 e 35 mil, caiu para menos da metade também: 14 mil. E está disputando o título.
Tanto Atlético/MG e Cruzeiro como Flamengo e Fluminense pagam em 2010 o preço não terem estádios próprios. E assim será, pelo menos, nos próximos dois campeonatos. A CBF “gastará” milhões, até uns poucos bilhões, reformando Mineirão e Maracanã, entre outros, para a Copa do Mundo de 2014. Até lá, estes quatro clubes terão que utilizar casas alternativas. O Cruzeiro ia bem em Uberlândia, mas, como a região é recheada de simpatizantes de clubes paulistas, a derrota para o São Paulo com estádio meio a meio traumatizou Cuca. O Galo parece ter se achado em Sete Lagoas, embora o Mineirão fizesse muito mais efeito sobre os adversários. Fla e Flu ainda não convenceram suas torcidas de que o Engenhão é sua casa alugada até lá. Mas terá que ser: em Volta Redonda, o Rubro-Negro não consegue nem 20% de uma renda satisfatória para Série A. No último sábado, contra o Guarani, 40 mil viram o jogo em Engenho de Dentro. É um começo.
O Palmeiras é um caso à parte. Reforma o Palestra Itália, mas o Pacaembu, embora não seja seu estádio habitual, não chega a ser totalmente estranho. Sua baixa média de público este ano (11 mil, a 14ª melhor da Série A) se explica também pela fraca campanha e pelo desinteresse no Brasileirão. Na Sul-Americana, vimos grandes públicos. Contra o Goiás, foram 36 mil torcedores, número semelhante ao que o Corinthians, habitual usuário do estádio, costuma colocar.
Para quem gosta de grandes partidas disputadas em grandes e tradicionais estádios, sem dúvida é um esvaziamento. Os números das arquibancadas refletem isso claramente. A média de público do Brasileirão, entre pagantes e não pagantes, cairá de 20 a 25% de 2009 para 2010, a maior queda desde 2004, quando tivemos uma redução de quase 50% na presença de torcedores nos estádios. O número, que era de 16 mil em 2005, caiu para 14 mil em 2006, subiu para 19 mil em 2007, caiu para 18 mil em 2008, subiu para 20 mil em 2009 e está, neste exato momento, em 15,2 mil.
Abaixo, a relação de partidas disputadas “fora de casa” pelos clubes afetados. Lembrando sempre que a Copa é a principal, mas não única razão para as mudanças. Até o show de Paul McCartney forçou um clube a mudar de casa por uma rodada – no caso, o São Paulo, que ainda atuou em Barueri outra vez.
Campanhas dos clubes afetados em suas casas novas
Cruzeiro 71,4% em 14 jogos
Santos 66,7% em 3 jogos
Fluminense 61,9% em 7 jogos
Palmeiras 52,4% em 14 jogos
Flamengo 52,4% em 7 jogos
São Paulo 50,0% em 2 jogos
Atlético/MG 44,4% em 12 jogos
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