Com rodada de clássicos, Porto Alegre e Floripa estariam à beira de um grande domingo

Gre-Nais decisivos poderiam ter fechado todos os anos da era dos pontos corridos
Em 2011 vivemos provavelmente o melhor Campeonato Brasileiro desde a adoção dos pontos corridos. Além do bom nível geral do torneio e das renhidas disputas de tabela, a chamada "rodada de clássicos" fechando a competição garantiu um clima decisivo no país inteiro no final de ano, criando uma tensão extra mesmo para quem não disputava mais nada. Quem não havia mais o que disputar ganhou a motivação de, ao menos, estragar a festa do rival. Cenário muito mais interessante que o do desagradável clima de suspeita de "entrega-entrega" vivido em anos anteriores, e que vem se repetindo agora, com Fluminense e Vasco.

Nada menos que 19 das 20 equipes chegaram à última rodada daquele ano com algum interesse na partida derradeira, o que tornou aquele Brasileirão o mais próximo da perfeição do ponto de vista competitivo - nenhum campeonato no mundo, nem na era do tão amado mata-mata conseguiu isso. Claro, o equilíbrio do campeonato colaborou bastante: caso não tivéssemos a rodada de clássicos em 2011, ainda assim 14 clubes chegariam à rodada fatal com interesse. O Brasileirão 2011 foi uma exceção.

A experiência foi repetida em 2012, ano em que a CBF mudou seu critério de distribuição de vagas para a Copa Sul-Americana. A medida encurtou o ano de muita gente: com a ida para a segunda copa do continente assumindo um critério diferente, não definido no Brasileirão do ano anterior, o número de clubes interessados na última rodada despencou: apenas cinco clubes chegaram com alguma indefinição sobre seu futuro. Graças aos clássicos, o número subiu para oito.

Por um erro seu na concepção do calendário, portanto, a CBF criou alguns clássicos praticamente amistosos (Santos x Palmeiras, Flamengo x Botafogo, Fluminense x Vasco, São Paulo x Corinthians) na rodada final, o que gerou críticas e levou à abolição da medida. Só que um fato passou despercebido nisso tudo: nenhum campeonato desde 2003 chegou à última rodada com campeão definido, G-4 definido e rebaixamento quase definido como naquele ano. Ou seja: o Brasileiro de 2012 também foi uma exceção

É uma pena que isso tenha ocorrido: jogos entre rivais podem até não ter interesse de tabela eventualmente, mas sempre criam uma tensão extra, especialmente onde a rivalidade é mais dualizada, como em Porto Alegre, Curitiba, Belo Horizonte, Salvador ou Recife. Estes jogos, por si só, já atraem fortemente o interesse do público local, e serviriam para dar um fôlego à competição mesmo em anos onde o Brasileirão chegue frio para a última rodada. E mais: quando interesses de dois clubes colidem na última rodada, temos um clássico onde não apenas a briga de um dos rivais é para estragar a festa do outro, mas um duelo vital para ambos, incandescente, mágico, cheio de ingredientes. O confronto entre o desesperado Atlético-PR e o perto-do-G-4 Coritiba de 2011 não nos deixa mentir.

Abaixo, trazemos uma projeção de quantos clubes se interessariam a mais caso de 2006 a 2014 fosse sempre adotada a rodada de clássicos no final. Claro, há imperfeições no modelo: se esses clássicos não fossem disputados antes, as tabelas da última rodada seriam diferentes. Mas os resultados não seriam muito distintos, e dariam uma ideia aproximada de como os torneios seriam bem mais quentes em suas respectivas rodadas derradeiras.

2006: de 6 para 7 interessados.
2007: de 13 para 18 interessados.
2008: de 11 para 16 interessados.
2009: de 12 para 17 interessados.
2010: de 11 para 16 interessados.
2011*: de 14 para 19 interessados. 
2012*: de 5 para 8 interessados.
2013: de 11 para 13 interessados.
2014: de 5 para 7 interessados.
2015: de 9 para 13 interessados.
* Anos nos quais foi adotada a rodada de clássicos.

A melhora na competitividade seria clara: em média, passaríamos de 9,7 clubes com algum tipo de interesse na última rodada para 13,4 - ou, de 48,5% de clubes envolvidos na disputa para 67%. Em anos como 2009, teríamos cenários absolutamente fantásticos: em vez de enfrentar um Grêmio de férias para diminuir as chances do Inter, o Flamengo teria de encarar um Botafogo ameaçado de rebaixamento, no Maracanã lotado, enquanto o Colorado decidiria sua vida contra o maior rival. Ou um Ba-Vi direto contra o rebaixamento, no ano passado. Ou um Figueirense x Avaí contra o rebaixamento amanhã. Ou, quem sabe, um Gre-Nal valendo o vice para o Tricolor e o G-4 para o Colorado? Aliás, em todos os anos de pontos corridos, sempre teríamos tido um Grêmio x Internacional decisivo encerrando a temporada.

De toda forma, a reorganização das vagas para a Sul-Americana, tanto quanto a abolição da rodada de clássicos, é também a grande vilã de rodadas finais desinteressantes no Brasileirão. Desde que o critério foi alterado, a média de clubes envolvidos em alguma disputa de tabela na última rodada caiu de 11,2 para 7,5, uma queda de 33%. Estamos falando tudo isso em um ano no qual temos boas brigas, seja pelo vice-campeonato, Libertadores ou rebaixamento. Em 2015, tirando o clima ruim que se instalou antes de Figueirense x Fluminense, nada a reclamar quanto à última rodada do nosso campeonato, que promete ser bem interessante.

Foto: Ricardo Duarte/Internacional.

Comentários

Vine disse…
Belo trabalho. Mostra como a CBF ou tem a cabeça muito dura ou uma capacidade de análise escandalosamente limitada.
Não dá pra ser só desinteresse essa sucessão de falhas...
Vicente Fonseca disse…
Valeu, Vine!

Fico até meio constrangido de reclamar disso, diante de tanta coisa mais errada, mas enfim, é obrigação nossa apontar esse tipo de falha também.