A Libertadores de cada um



Não houve zebra ou qualquer coisa de tipo. Nem passamos perto disso, por sinal. As oitavas de final da Libertadores apenas reafirmaram a Copa que Atlético Mineiro e São Paulo fizeram até aqui. O Galo, soberano, desfilou qualidade com um futebol cada vez mais impressionante, em sua melhor atuação na competição até o momento - e olha que não foram poucas as grandes partidas deste time. O Tricolor, que chegou até aqui se arrastando, encerra sua vida no torneio com a certeza de que foi até mais longe do que deveria, pela pobreza do futebol apresentado.

Talvez o Atlético tenha entrado tão ligado para evitar qualquer tipo de estigma ("nunca ganhou Libertadores", "Cuca sempre acaba entregando", "o líder geral da fase de grupos nunca é o campeão"), mas é improvável. O que esta equipe tem de sobra é futebol, e ele basta para acabar ou até esquecer que existem estigmas. Foi uma atuação avassaladora. O primeiro tempo terminou 1 a 0, mas a diferença mínima não representava a superioridade do Galo. Cuca, dispensável dizer mais uma vez, faz um excelente trabalho. Seu time marcou o São Paulo sob intensa pressão, com um fome que poucas equipes têm.

Como é um time organizado, que corre certo o jogo todo, o Atlético acabou a partida inteira, marcando com voracidade os paulistas, mesmo com a goleada já construída e a classificação assegurada. Forçar o erro de um time com limitações técnicas, de fato, era mais que meia vitória. Se de um lado a saída de bola tinha Gilberto Silva e Réver, de outro tinha Édson Silva e Rafael Tolói - isso para pegarmos só o miolo de zaga. Dois zagueiros fracos tendo que marcar o sistema ofensivo mais irresistível da América do Sul.

Se a diferença de qualidade entre Atlético e São Paulo já é grande só nos nomes, em campo ela aumenta a níveis estratosféricos. O golaço de Jô aos 18 minutos veio numa jogada linda e rápida envolvendo Bernard e Diego Tardelli. Poderia ter sido ocasional, já que o toque para o centroavante veio de um são-paulino, não tivesse se repetido outras duas vezes. Aliás, centroavante? Quem é o centroavante do Galo? Difícil responder, já que Tardelli, Bernard, Jô e Ronaldinho se movimentam de tal forma que fica impossível determinar quem ocupa cada espaço teórico dentro de campo.

Os quatro jogaram demais hoje, mas o gaúcho é que foi o maestro. No segundo tempo, Ronaldinho deu show. A jogada espetacular pelo lado esquerdo, onde quase fez dois são-paulinos se chutarem tentando marcá-lo, merecia ter terminado em gol, tamanha a genialidade. No entanto, é injusto colocar no quarteto toda a construção da vitória. O segundo gol, por exemplo, surge de um passe de cabeça fantástico de Leandro Donizete para Jô. Foi o gol que matou o São Paulo, que ameaçava até equilibrar o jogo no começo do segundo tempo. O Galo demorou a definir a classificação, embora nunca estivesse realmente correndo algum risco. O terceiro veio em mais uma das tantas bobagens do fraco Rafael Tolói. Jô fez seu terceiro, e Luís Fabiano descontou após falha de Victor, que estava mal posicionado e rebateu bola que deveria ter sido segura.

Critiquei aqui o Atlético por ter perdido para o São Paulo na fase de grupos quando poderia eliminá-lo, deixando a desejar em seu jogo mais decisivo do ano até então. Mas o modo categórico como o Galo eliminou o São Paulo não deixa dúvidas de que se trata do melhor time da Libertadores, com certa folga, o que não significa, claro, que será o campeão. É apenas o principal favorito, e por razões bem consistentes: é uma equipe que joga de forma compacta, ataca pelos dois lados e pelo meio, todos marcam, todos atacam, sempre com organização. É um time experiente para segurar a pressão fora de casa e que conta com um caldeirão a seu lado em Belo Horizonte - embora não vá poder usá-lo a partir das semifinais. É um timaço, um Atlético que há gerações não se via, um time que joga um futebol tão vistoso e superior como há tempos não se via numa Libertadores. A América que se vire para depenar esse galo brabo de rinha.

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