A vitória do planejamento

O Corinthians campeão da América é um dos típicos casos brasileiros de equipes que precisaram de um rebaixamento para se reestruturarem e voltarem a ter sucesso. Costumava dizer, lá pelo final de 2005, logo após a conquista do título brasileiro, que a suspeitíssima parceria entre Kia e Dualib iria levar o time à segunda divisão em breve, como levou. Do final de 2007 para cá, foram quatro anos e meio de reerguimento. Um trabalho que começou sem tantos investimentos como naquele time que tinha Carlitos Tevez, mas muito mais sólido porque tinha uma concepção de futebol.

O título da América teve duas ressurreições. A primeira foi comandada por Mano Menezes. Subiu sem sustos em 2008, montou o time baseado em Ronaldo no ano seguinte para buscar a Copa do Brasil e chamar a atenção do clube para pesados investimentos, que se sucederiam nos anos seguintes - mas sem parcerias "mágicas", só pela imagem do Fenômeno. Jogou a Libertadores em 2010, disputou o título brasileiro até a última rodada, já sem Mano, que foi contratado pela seleção brasileira. Apostou em Tite, e teve o mérito de não o demitir na fiasquenta queda para o Tolima na pré-Libertadores de 2011. Ressurgiu das cinzas de novo, foi campeão brasileiro e sedimentou o caminho para levar o título sul-americano agora. Tudo degrau por degrau.

Em um ano e meio, o Corinthians passou de time que realizou a pior campanha brasileira na história da Libertadores para ser o primeiro brasileiro campeão continental invicto em cinco décadas. A caminhada começou de forma dramática: um empate em 1 a 1 com o fraco Deportivo Táchira, conquistado no último minuto de jogo, na Venezuela. Foi o único susto da primeira fase: a equipe passaria por cima do Nacional/PAR, conquistaria quatro pontos contra o bom Cruz Azul e golearia o próprio Táchira em São Paulo, por 6 a 0.

Com Cássio no gol, o último calcanhar de aquiles do time estava solucionado. O sistema defensivo, que já era sólido, ficou intransponível. A equipe abriu os mata-matas empatando em 0 a 0 com o Emelec, em Guayaquil, mas golearia em casa por 3 a 0. Contra o Vasco, o time de Tite mostrou, pela primeira vez, cara de campeão. Em dois duelos duríssimos, segurou um empate sem gols em São Januário. Em São Paulo, quando tudo levava a crer que iríamos à decisão por pênaltis, venceu por 1 a 0, numa cabeçada certeira de Paulinho, aos 43 do segundo tempo. Gol de quem tem estrela de campeão.

O desafio na semifinal era simplesmente o Santos, algoz dos últimos tempos, com Neymar e o peso de ser o atual campeão da América. Emerson Sheik fez o golaço que deu a vitória por 1 a 0 na Vila Belmiro. Até ali, reparem, o time não havia sofrido nenhum gol fora de casa no mata-mata. No Pacaembu, saiu perdendo, mas chegou ao empate que o classificou à final. Decisão contra o Boca Juniors, seis vezes campeão continental. Saiu perdendo na Bombonera, mas obteve o empate com o jovem e improvável Romarinho, no fim do jogo. O empate abriu caminho para os 2 a 0 finais em São Paulo, conquistados ontem à noite.

A campanha foi praticamente perfeita. O Corinthians merece a festa, e merece que ela se estenda por mais uns dias. Mas logo o foco deve voltar ao Campeonato Brasileiro, competição relegada pelo clube a segundo plano justamente por causa da Libertadores. Saindo da zona de rebaixamento e ficando tranquilo, o time deve iniciar sua preparação ao Mundial. Tite é inteligente o suficiente para saber que poupar seus jogadores para a competição de dezembro é um erro que não deve ser cometido. Exemplos não faltam, Internacional e Santos são só mais os recentes. E tudo está tão correto no Corinthians que duvido que isso vá acontecer. Hoje, o Timão é melhor que o Chelsea - algo que há anos não acontecia na relação Europa x América do Sul. Há muitos meses pela frente, mas a final do Mundial, se for mesmo entre paulistas e ingleses, promete ser bastante fechada, pela característica dos dois times. Drogba, por sinal, não jogará.


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