O surrealismo eleitoral gremista

Lourenço Fonseca*

Antes de tudo, um esclarecimento: não se trata de questionar os resultados do pleito que elegeu 150 novos conselheiros da chapa Renova Tricolor no último sábado. Em verdade, é sabido que os grupos que formaram a Chapa 1 historicamente defendem a redução da cláusula de barreira nas eleições gremistas, hoje de 30%.  Ocorre, no entanto, que os resultados nas eleições do Conselho Deliberativo gremista são excepcionalmente ilustrativos das distorções que esse sistema eleitoral pode provocar, de modo que o momento para o debate não pode ser outro.

Chapa 1 – Renova Tricolor – 2.327 votos (50,42%)
Chapa 2 – Dá-lhe Grêmio – 1.159 votos (25,11%)
Chapa 3 – Terceira Via – 1.129 votos (24,46%)

Como se depreende da simples análise da votação, a Chapa 1 obteve, aproximadamente, a metade dos votos válidos, ao passo que as chapas 2 e 3 obtiveram, cada uma, um quarto do eleitorado. Contudo, à medida que essas não atingiram os 30% necessários para colocar conselheiros, todos os 150 novos integrantes advêm da Renova Tricolor.

Trata-se de uma situação surreal: quanto mais chapas concorrerem, maior a divisão de forças no Conselho, certo? Não no sistema gremista. Não é necessário grande esforço para perceber que, se mais opções forem oferecidas ao sócio, diluem-se os votos, e menores as chances de quaisquer dessas ultrapassarem o quociente mínimo. A pluralidade de concorrentes, indicativo de pulverização política, acaba por fomentar hegemonias. Diversas correntes do clube que obtiveram os mesmos 50% do grupo vencedor ficaram de fora. A eleição do Conselho Deliberativo do Grêmio, concluo, não foi proporcional, mas majoritária.

Note-se o inusitado do pleito: o abominável “chapão”, expressão que indica a chapa única, formada à conveniência da cúpula dos grupos políticos, retirando do sócio qualquer poder de decisão, provavelmente representaria mais fielmente o que ocorre dentro do clube, pois conteria em sua formação agentes de facções distintas, retratando a diversidade de filiação inerente a qualquer órgão colegiado. Nenhum acordo de líderes seria capaz de colocar no Conselho Deliberativo integrantes oriundos de um mesmo núcleo.

Cumpre frisar, por fim, que me parece salutar a manutenção da cláusula de barreira na eleição para Presidência - e Conselho de Administração – no mínimo nos patamares atuais, 30%. Para gerir um clube é preciso estabilidade institucional que nem o apoio da torcida associada suficientemente supriria. Se o Presidente Duda Kroeff, eleito com maioria interna e pelo voto do associado, já foi classificado como “isolado” em tempos difíceis, como um Presidente que detivesse 20% do Conselho teria respaldo para atravessar uma crise? O Conselho Deliberativo, no entanto, é uma instância de pluralidade, feito para agregar maiorias e minorias e o seu sistema eleitoral deveria, se não estimular, ao menos possibilitar a representação da diversidade. Paradoxalmente, com a cláusula de barreira adotada pelo Grêmio, quanto mais concorrem, menos se elegem.

* Servidor Público Estadual e sócio do Grêmio.

Comentários

Vicente Fonseca disse…
Muito bem apontado: quanto mais chapas, menos chance de pluralidade. Ótimo ponto de vista.

Pelo que fiquei sabendo do que o André Kruse relatou da reunião de ontem do Conselho, é possível que a cláusula de barreira já caia para 20%. Pela eleição deste ano, já se justifica.
Faraon disse…
1) Mazah galo cinza, * Servidor do Ministério Público Estadual do Rio Grande do Sul, esse tá com GRANA!!! hshshs

Compreendo o sumiço dos programas.

2) Fiquei imaginando uma eleição com 5 chapas de verdade, com semelhante peso político. Ninguém faria 30% e o conselho seria extinto?
Vicente Fonseca disse…
hsdhsdh

Cenário surreal, Faraon.
Sancho disse…
Não se pode em nome de uma maior democratização sermos irresponsáveis. O objetivo é exatamente aumentar os bônus e reduzir os ônus, sob pena de o clube sucumbir. Democracia em si, não é solução para nenhum problema.

Eu até teria uma sugestão de reforma:

I. Conselho Deliberativo
Renovação total do Conselho a cada dois anos. O sócio votaria não diretamente numa chapa, mas num movimento. Os movimentos é que ordenariam seus candidatos.

As chapas -ou grupos- continuariam como coligação de movimentos, mas agora sem conchavo para montagem da nominata.

A quantidade de conselheiros de cada grupo se daria pela soma de votos dos movimentos coligados, porém seriam distribuídos conforme a votação de cada um desses movimentos.

Os grupos seriam limitados em 3 (obrigando os movimentos a se entender e auxiliando o sócio a identificar esses movimentos), e a cláusula de barreira em 20%.

II. Presidência e Conselho de Administração
Seria vinculada à eleição do Conselho. Cada Grupo indicaria seu candidato a presidente e os demais para o Conselho de Administração, ordenados (obrigando os movimentos a se entender e auxiliando o sócio a identificar esses movimentos).

O candidato da chapa com mais votos para o CD estaria eleito.

O restante do Conselho de Administração seria distribuído proporcionalmente aos votos de cada chapa, respeitado a cláusula de barreira.


Abraço.
Sancho disse…
Claro, é rascunho. Apenas para discussão.
Vicente Fonseca disse…
Sempre válida a discussão, Sancho.

Abraço.
Eduardo disse…
Assino embaixo. O conselho eh o parlamento, eh o lugar da pluralidade. Eh ridiculo que 25% dos socios-votantes nao seja representada. O sistema foi feito para fomentar o chapao. Clausula de barreira tem que ser menor que 5% pra ser democratico. Reduzir pra 20% nao resolve NADA.
Prestes disse…
Cláusula de barreria pode ter, mas 30% é muito.
Vicente Fonseca disse…
Respeito a tua posição, Eduardo. Mas nesta eleição, especificamente, baixar para 20% adiantaria, e muito. Acho que se baixar para 20% já será mais um passo rumo à democratização do clube. Não se pode desprezar uma redução, por mais que não seja, ainda, o ideal.